Do Justificando
Por Mauro Donato*
Segundo o mais recente ranking sobre
liberdade de imprensa da ONG Repórteres Sem Fronteira, o Brasil ocupa a
104ª posição. Caiu 5 posições (havia caído 9 em 2013 e agora desceu mais
um pouco). Centésima quarta posição entre 180 países é uma colocação
preocupante e vexatória. Determinantes para a queda foram o aumento da
violência contra jornalistas, o registro de ameaças e a quantidade de
mortos durante o ano passado. Total de sete jornalistas assassinados.
Como pode isso?
Para os leitores dos grandes jornais,
telespectadores dos canais abertos de TV e ouvintes das grandes rádios,
um ranking desses irá soar como peça de ficção. Claro, nada disso
acontece com os jornalistas que trabalham para aquela meia dúzia de
famílias detentoras de quase oitenta por cento da mídia. Estes estão
alinhados e repetem em uníssono o que seus chefes querem que seja dito e
escondem o que seus patrões desejam que seja escondido.
A perseguição é sobre os independentes, é
inegável. Veja quantas dificuldades o DCM enfrentou ao publicar o
documentário Helicoca. “É um ambiente de medo para os jornalistas,
sobretudo os jornalistas independentes, blogueiros”, disse Emanuel
Colombié, chefe do departamento de pesquisas da Repórteres Sem
Fronteiras.
Mas e o cinegrafista da Band? A tragédia
ocorrida com Santiago Andrade em 2014 foi um acidente. Terrível, mas um
acidente. Ninguém lançou a bomba propositalmente no cinegrafista da
Band e, infelizmente, o caso dele é um bom exemplo da disparidade no
tratamento da questão quando acontece com um ‘deles’. Toda a cobertura
dramática, a dedicação em apontar os culpados, o enunciado destacando
que as manifestações faziam sua “primeira vítima fatal”. Santiago era
então a 11ª pessoa a morrer, não a primeira, desde os protestos de 2013 e
dezenas de outros jornalistas já haviam sido feridos, muitos com
gravidade como a perda de um olho e outros tendo seus equipamentos
destruídos ou confiscados. Mas eram todos independentes e os casos não
vieram para as manchetes.
O oligopólio da mídia brasileira é um
dos principais motivos para o atraso do país. Seu monobloco alienador
faz com que andemos para trás em diVersos rankings como de liberdade de
imprensa ou de educação. Desinforma para manter seus privilégios.
Um exemplo nítido: Desinformados, muitos
combateram o Marco Civil Regulatório da internet. Lobotomizados pela
mídia unificada, diziam que se tratava de censura, que o PT queria
controlar a rede. Agora estão aí desesperados com a notícia de que as
operadoras desejam limitar e cobrar o acesso de forma diferenciada. E
aqui mais uma vez vale a pena observar a cobertura jornalística atual
sobre o tema. As operadoras de telefonia são grandes anunciantes. Em
razão disso, a Globo tem se empenhado em explicar o porque da medida.
Com infográficos, depoimentos técnicos minuciosos e longas reportagens,
está claramente defendendo os amigos que detêm outro oligopólio.
Os barões da mídia estão pouco se
lixando para um ranking como o do Repórteres sem Fronteira. Estão sempre
atuando em bloco. Basta observar a reação orquestrada às notícias
internacionais recentes. O Guardian, o New York Times, o Fìgaro e outros
jornais estão tratando com seriedade e preocupação o que se passa por
aqui no cenário político. E nem era para ser diferente. Para quem está
de fora fica ainda mais evidente o teatro. Vá explicar para um gringo
que quase 400 deputados com a ficha suja votaram pelo impeachment de
alguém sem prova de crime.
Ato contínuo, a mídia brasileira
dedica-se a desqualificar essa leitura. Renata LoPrete, da GloboNews,
disse que eram comentários superficiais, carentes de fundamentações.
Curioso é que a mesma mídia internacional é vista como rainha da cocada
preta quando comenta sobre nossa economia interna, dá seus pitacos
prevendo até o que ainda não ocorreu. Quando é para especular, tudo bem?
A mando das diretorias, as redações
alternam o complexo de vira-lata com uma soberba vomitiva. Portanto, na
grande mídia você não verá destaque para este vergonhoso ranking da
Repórteres sem Fronteira, lá o que importa são os rankings de economia.
O ranking da ONG só confirma o quanto é
perigoso, para um jornalista, não fazer parte da mídia dos Marinho, dos
Saad, dos Mesquita. Para o público em geral, perigoso é informar-se
apenas por ali. Vira vítima das operadoras de telefonia, do mercado
automobilístico, da especulação imobiliária, financeira, e assim vai.
Todo tipo de golpe fica fácil num ambiente assim.
*Mauro Donato é Jornalista, escritor e fotógrafo nascido em São Paulo