SOPA – a nova ameaça à liberdade da rede
Por Bia Martins, do blog Autoria em RedeTenho escrito aqui no blog sobre as transformações nos modos de produção e circulação dos bens intelectuais na atualidade. Padrões anteriormente bem definidos de controle, tanto em relação à autoria de uma obra quanto a sua distribuição e monetarização, vêm sendo desestabilizados por práticas sociais de compartilhamento que estão impondo modelos abertos de criação e acesso a esses bens. Esta mudança vem ocorrendo, de fato, apesar da resistência das grandes empresas de mídia que, por seu lado, têm desenvolvido todo um instrumental tecnológico e jurídico na tentativa de impedir esse fluxo.
Pois uma das mais fortes reações à mudança está se dando agora, com a apresentação de um projeto de lei que está para ser votado pelo Congresso dos EUA. Se for aprovado, o projeto conhecido pelo acrônimo SOPA (Stop Online Piracy Act) permitirá que se processem sites acusados de permitir ou facilitar o descumprimento dos direitos autorais e de propriedade intelectual, podendo determinar a sua exclusão em resultados de mecanismos de busca, o corte de anunciantes e até mesmo o bloqueio do acesso a eles. Para isso, basta que o site em questão tenha links para outro site que tenha conteúdo tido como não autorizado. Por conta disso, grandes sites, como Facebook ou WordPress, por exemplo, e também os provedores poderão optar pela censura prévia a conteúdos, pelo medo da punição. E o pior é que a lei terá repercussão mundial porque vai legislar sobre todos os servidores web localizados nos EUA, por onde passa grande parte do tráfego da internet.
Essa iniciativa de restrição à liberdade na rede atende aos interesses das grandes corporações de mídia, como indústria fonográfica e estúdios de cinema, que querem controlar o fluxo de arquivos de som e vídeo especialmente. E, por outro lado, conta com o repúdio de novas grandes empresas de tecnologia, como Google e Facebook, que baseiam seus negócios na livre circulação de dados. A boa notícia é que a Apple e a Microsoft, as duas principais companhias que fazem parte do Business Software Alliance (BSA), retiraram nos últimos dias o apoio ao projeto.
Confira o infográfico, em inglês, que resume a questão.
Nesse embate de gigantes, o que está em jogo é o modelo de circulação de bens intelectuais na sociedade. Como já argumentei em outros posts, do meu ponto de vista, essa é uma mudança sem volta que está relacionada com o novo modelo de produção capitalista, de caráter cognitivo, no qual o conhecimento está no cerne da produção: é o conhecimento que produz mais conhecimento. Nesse contexto, a informação precisa circular livremente para que possa gerar cada vez mais valor. Não é à toa que, apesar de todas as medidas restritivas, as práticas de compartilhamento de dados, como os downloads de música e vídeo, não parem de crescer.
No entanto, estamos ainda no momento de disputa entre o antigo e o novo modelo, e deveremos assistir ainda a muitos rounds pela definição dos parâmetros sobre as formas de circulação desses bens. Não há dúvida de que haverá a necessidade de chegar a novos marcos regulatórios, mas eles deverão levar em conta o contexto econômico e cultural da atualidade, que tem no compartilhamento da produção intelectual e na cooperação produtiva o seu modus operandi.
Quem tiver interesse em ler mais sobre esse embate, acaba de ser publicado meu artigo Autoria, propriedade e compartilhamento de bens imateriais no capitalismo cognitivo, na Liinc em Revista