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segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

A balcanização da internet pode começar no Brasil

Tentativas de cercear os direitos digitais dos brasileiros contrastam com a fama do país de bastião da liberdade na rede


Duas pessoas usam seus celulares em frente ao logo do WhatsApp em Londres.
Bloomberg
Uma juíza de São Paulo chocou o Brasil em dezembro ao exigir que todas as operadoras de telefonia do país bloqueassem por 48 horas o acesso à plataforma de mensagens instantâneas WhatsApp. A decisão causou espanto, mesmo em um país já acostumado com constantes escândalos. Aproximadamente doze horas depois do início do bloqueio, outro juíz reverteu a situação. Mas, independente disso, milhões de brasileiros ficaram compreensivelmente frustrados e defensores de liberdades civis do mundo inteiro demonstraram sua preocupação.

Brasileiros levam mídias sociais a sério. O país tem uma das percentagens de presença na internet que mais cresce no mundo. Ferramentas como Facebook, Twitter e o próprio WhatsApp não são usadas apenas para expressar opiniões - os aplicativos são um meio de comunicação alternativo acessível, face aos preços exorbitantes cobrados pelas empresas de telecomunicação do país por serviços de mensagem similares, o que garante sua popularidade. Prova disto, um estudo recente levantou que o WhatsApp é utilizado por 93% dos brasileiros com acesso à Internet.

A explicação oficial dada pela juíza para suspender o WhatsApp é o fato de o Facebook, empresa dona do aplicativo, ter se recusado a cumprir uma ordem judicial para fornecer informações pessoais e registros de conversas ao Ministério Público para uma investigação criminal. O juiz que reverteu a decisão sugeriu que, no lugar do bloqueio, fosse aplicada uma multa à empresa. Independente da gravidade dos crimes investigados - que envolvem investigações sobre homicídios e tráfico de drogas - a juíza foi imprudente em sua decisão e ameaça liberdades básicas dos brasileiros.


O ato era, em certa medida, previsível e juízes estão longe de ser a única ameaça ao mundo virtual brasileiro. Tramita no Congresso Nacional um novo projeto de lei (PL 215/15) que, se aprovado, vai reverter importantes disposições do Marco Civil da Internet, aprovado em 2014. Aliado a outra legislação sobre segurança de dados, esperava-se que o Marco Civil garantisse direitos básicos. Mas, desde o início, vários procuradores e policiais civis foram contra, argumentando ser uma provisão inconstitucional. Indo na sua linha, o PL 215/15 tornaria mais fácil o acesso a informações pessoais de cidadãos sem a necessidade de uma ordem judicial.

O PL parece ter sido tirado de um livro de George Orwell. Chamado de "PL Espião" por quem o critica, o projeto exigiria que os brasileiros registrassem seus dados pessoais (como endereço de casa, número de telefone e CPF) para acessar páginas na internet. Seus apoiadores defendem que isto está em total conformidade com o artigo quinto do primeiro capítulo da Constituição Brasileira, que veda o direito ao anonimato na livre manifestação de opinião. Além disso, sujeitaria as pessoas a acusações de difamação por qualquer comentário feito nas mídias sociais. Também impactaria a livre expressão de oposição política - oportunidade de silenciamento que seria bem recebida por alguns dos políticos menos populares.

Um dos articuladores-chave do PL Espião é Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, também um dos principais oponentes do Marco Civil. À época de sua votação, Cunha uniu-se à bancada evangélica do Congresso para tentar derrubá-lo. Para complicar a situação, Eduardo Cunha está sendo investigado pela Polícia Federal por corrupção e recebimento de propina, acusações a que nega veementemente. Independentemente das ações de Cunha, grupos como o Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS) e o Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (CTS-FGV) argumentam que a nova lei seria provavelmente considerada inconstitucional
Essas tentativas de cercear os direitos digitais dos brasileiros contrastam com a fama do país de bastião da liberdade na internet. Ao aprovar o Marco Civil, o Governo sinalizava ao mundo inteiro que leva a sério a neutralidade da rede e a soberania digital, iniciativa aplaudida por vários, incluindo Tim Berners-Lee, fundador da World Wide Web. Basicamente, o país declarou que os princípios democráticos da liberdade, privacidade e direitos humanos se aplicavam da mesma maneira no mundo físico e no ciberespaço.

A presidente Dilma Rousseff também projetou a agenda da liberdade digital para a arena global. Sua popularidade cresceu depois do escândalo de espionagem da National Security Agency (NSA), agência americana que estava espiando seus emails e telefonemas em 2013. O tema foi também central em seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas no mesmo ano. Em 2014, o Brasil organizou o NETmundial, uma conferência sobre governança da Internet. E em novembro, o Brasil foi palco do Fórum sobre Governança na Internet, apresentando sua "abordagem de múltiplas partes interessadas" como um modelo a ser replicado e adotado em outros países.

Apesar do Whatsapp já ter voltado ao ar, o estrago já está feito. O cerceamento de liberdades fundamentais pelas autoridades brasileiras revela um choque de prioridades contraditórias. O Brasil parece ser um país que aspira ao mesmo tempo às liberdades digitais e à expansão do estado de vigilância. O país se orgulha de sua internet livre e aberta, mas sua polícia reprime ativistas virtuais com uma regularidade alarmante.

Enquanto isso, o país tem progressivamente militarizado sua infraestrutura de cibersegurança e ciberdefesa. Consideremos, por exemplo, as formas por meio das quais o Brasil respondeu aos grandes protestos de 2013. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e o Comando de Segurança Cibernética do Exército (CDCiber) vigiavam manifestantes civis e políticos. Além disso, o Governo brasileiro constantemente entra em conflito com empresas de tecnologia como o Google pelo acesso a informações pessoais de usuários. Todo Governo tem de lidar com tensões semelhantes, mas as políticas públicas devem se esforçar para encontrar um equilíbrio entre a proteção das liberdades civis, de um lado, e o uso excessivo do aparato de segurança, de outro.

O Governo brasileiro também vive uma relação complicada com empresas de internet sobre acesso a dados pessoais de usuários. Em 2012, a polícia prendeu o diretor do escritório do Google no Brasil por ter se recusado a tirar do Youtube um vídeo onde um político era xingado. Em 2014, um juiz também ordenou a suspensão de aplicativos da Apple, Google e da Microsoft que estariam envolvidos em casos de ciberbullying. Apesar da Sinditelebrasil, associação que une empresas do setor, não ter iniciado nenhum movimento de confrontação aberta, pelo menos uma companhia declarou publicamente que considerou a decisão desproporcional.

Com sua democracia recente, o brasileiro é especialmente sensível a cerceamentos de suas liberdades fundamentais, mesmo as digitais. O Ato Institucional no. 5 (AI-5), decreto que suspendeu o habeas corpus após o golpe militar de 1964, é um bom exemplo, do qual não devemos esquecer. Políticos e juízes brasileiros conhecem melhor que ninguém o perigo de se cercear direitos fundamentais. A liminar judicial do mês passado, junto com propostas retrógradas como o PL 215/15, estabelecem um precedente perigoso, tanto interna quanto internacionalmente. Ninguém esperava que a balcanização da internet fosse começar no Brasil. Todos esperam que esse tipo de decisão se confirme como exceção e não como regra no país.

Robert Muggah é o Diretor de Pesquisa do Instituto Igarapé no Rio de Janeiro, Diretor de Pesquisa e Políticas da Fundação SecDev e membro do Conselho da Agenda Global sobre Fragilidade, Conflito e Violência do Fórum Econômico Mundial. Nathan B. Thompson é pesquisador do Instituto Igarapé.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

O feici e seu poder tentacular...

18/12/2015 - Copyleft
Carta Maior 

O Whatsapp caiu e a culpa é do Facebook.

A responsabilidade originária deste dano é da postura arrogante e unilateral desta empresa que dissimuladamente alega operar pelo bem comum


Pedro Ekman* reprodução

O Brasil amanheceu nesta quinta-feira sem trocas de mensagens pelo Whatsapp e a culpa é do Facebook. Para quem está chegando agora, vale avisar que o Grupo Facebook de Mark Zuckerberg é também dono dos aplicativos Whatsapp e Instagram. A justiça determinou a suspensão por 48 horas do Whatsapp no Brasil por descumprimento de ordem judicial que determinava o acesso a dados do aplicativo de pessoas que estavam sendo investigadas.


Zuckerberg se disse “chocado que os esforços em proteger dados pessoais poderiam resultar na punição de todos os usuários brasileiros”. Balela, Zuckerberg não está preocupado com a privacidade dos brasileiros, ele manipula e vende todas as informações que coleta de absolutamente toda a população ao redor do mundo, mesmo aquelas privadas que não era para ninguém mais saber a não ser você e o destinatário da sua mensagem. Mandar conteúdo íntimo ou particular por foto, texto ou som via Whatsapp, Instagram ou Facebook é o mesmo que tirar a roupa em um Shopping Center pensando que está entre as quatro paredes do quarto. Isso não é nem de longe estar preocupado com a privacidade da população.


A decisão judicial de suspensão também não é razoável. Retirar do ar o serviço de comunicação de toda a população como punição a um fato restrito a poucos usuários tampouco parece respeitar o princípio de proporcionalidade garantido na Constituição Federal brasileira. Seria o mesmo que mandar fechar todas as agências dos Correios por causa de um punhado de cartas. Ou retirar o serviço de telefonia do ar se a operadora se negar a instalar uma escuta definida por ordem judicial.


Mesmo a medida desproporcional da justiça brasileira, pelo menos em parte, também é culpa do Facebook. A conduta arrogante da empresa americana em se recusar a cumprir ordem judicial no Brasil praticamente leva o litígio a uma estratégia que possibilite algum efeito concreto. Antes de determinar a suspensão do serviço, a justiça já tinha determinado multa diária de 100 mil reais que chegou a somar 12 milhões de reais. A postura do Facebook foi a mesma: “Não devemos satisfação a vocês, nos submetemos apenas às leis dos Estados Unidos”.


Muitos vieram a público bradar que o Whatsapp só teria saído do ar por que no Brasil aprovamos o Marco Civil da Internet que permite à justiça fazer esse tipo de coisa. Não é verdade, mesmo antes da aprovação desta lei, um juiz já chegou a determinar a retirada de todo o YouTube do ar a pedido da Daniela Cicarelli que queria a retirada de um único vídeo privado. É o mesmo caso de se tentar eliminar o mensageiro por causa da mensagem. Um erro grosseiro que não acontecia no mundo analógico, mas que pode se tornar uma prática no ambiente digital por puro desconhecimento do tema pelo sistema judiciário ou por simples abuso de poder.


Responsabilizar a ferramenta pelo mal uso que se faz dela é algo torpe. Alguns podem dizer que a criptografia é uma ferramenta utilizada por quem quer se esconder para cometer crimes. Pode até ser, mas é essa mesma criptografia que protege o voto eletrônico, a sua conta no banco e as denúncias de corrupção do seu político preterido. Não se proíbe o uso de facas, elas podem ser usadas para machucar alguém e para passar manteiga no pão.


Além de devassar a privacidade de todos os cidadãos, o Facebook também comete outras ilegalidades diariamente. Os planos de celular com uso “gratuito” do Whatsapp e Facebook são uma afronta direta à lei brasileira que proíbe a discriminação de conteúdos na rede. O delito cometido pelo Facebook e operadoras de telefonia estabelece um pedágio seletivo na internet. Da mesma forma, não temos que suspender a atividade das plataformas, mas sim suspender os planos de venda discriminatórios.

Mais de um milhão e meio de usuários brasileiros descobriram o Telegram nas 12 horas em que vigorou a suspensão do Whatsapp. O Telegram tem garantias mais consistentes à privacidade do usuário, como serviço de mensagem criptografada com autodestruição automática e de ser mais divertido disponibilizando figurinhas (stickers) que podem ser produzidas pelos próprios usuários.  E como ele outros aplicativos de fato preocupados com a privacidade do usuário estão à disposição do público há muito tempo, tais como o Actor https://actor.im ou o Signal https://whispersystems.org/ recomendado por Edward Snowden.


- E se esses aplicativos são melhores por que nunca usamos?
- Por que ninguém tem.
- E por que ninguém tem?
- Por que o zapzap não desconta da franquia.


E assim seguimos em um ciclo vicioso que sufoca a competitividade comercial na rede aniquilando a inovação. Por isso é tão importante que se mantenha a rede neutra, sem discriminação econômica ou de qualquer natureza de um aplicativo sobre outros.


A medida adotada pela justiça foi desproporcional e não beneficia a sociedade penalizada pela conduta comercial da empresa. A responsabilidade originária deste dano é da postura arrogante e unilateral desta empresa que dissimuladamente alega operar pelo bem comum ao defender seus interesses privados. O debate que se abriu na sociedade e a descoberta de novos aplicativos e maneiras de consumo mais seguras e conscientes é o grande saldo positivo que tivemos nesse episódio e o custo disto para o grupo que quer tornar a internet um domínio privado pode ter saído mais caro do que os 12 milhões inicialmente cobrados de Zuckerberg.

*Pedro Ekman é do Conselho do Intervozes

domingo, 15 de março de 2015

Jornalismo, comunicação, democracia... o que há de novo?

Jornalistas se mobilizam por uma outra narrativa sobre os protestos

Grupos como o' Jornalistas Livres e em Defesa da Democracia' se unem nas redes sociais para se contrapor à cobertura parcial da mídia monopolista.


Najla Passos
Boletim Carta Maior
 
A desconfiança geral em relação ao conteúdo veiculado pela mídia tradicional e monopolista resultou no surgimento de vários coletivos de jornalistas e comunicadores interessados em divulgar uma outra visão sobre os protestos que ocorrem nesta sexta (13) e no próximo domingo (15) em todo o país. Exemplos são os grupos Jornalistas Livres e em Defesa da Democracia, sediado em São Paulo, e do Comunicadores pelo Brasil, com base em Brasília.

Ambos trabalham de forma colaborativa, divulgando conteúdo produzido por jornalistas independentes de todo o país e até do exterior, além das matérias e reportagens veiculadas pela imprensa alternativa. Também realizam análises de mídia, em tempo real, com críticas e informações qualificadas sobre a orientação da cobertura feita pelos meios de comunicação tradicional.

No Facebbok, o Jornalistas Livres apresenta assim o seu propósito: “cobertura colaborativa contra a manipulação da mídia tradicional; pelas narrativas independentes e plurais”. No final da manhã desta sexta, quase mil pessoas já haviam curtido a pagina no Facebook e compartilhavam os conteúdos disponibilizados.

Já o Comunicadores pelo Brasil explica, em uma espécie de manifesto, que é oriundo do grupo Comunicadores com Dilma que, durante as eleições, apoiou a candidatura da presidenta eleita. “Quando a gente se reuniu na campanha, foi para defender o projeto da candidatura da Dilma, mas já com bandeiras bem delineadas de defesa da luta dos trabalhadores. Agora, a conjuntura se agravou e precisamos defender também a democracia. Por isso, decidimos retomar o grupo de forma não personalista”, explica a jornalista Flávia Azevedo, que integra o coletivo.

De acordo com ela, o grupo reconhece a insatisfação que toma conta das ruas, mas não apoia o impeachment. “Não está bom. Defendemos que este governo dê uma virada à esquerda. Mas também não compactuamos com o golpismo. Por isso, nos somamos aos vários outros grupos que surgiram no país para fazer uma narrativa diferenciada desta crise, porque a cobertura da mídia tradicional é claramente desequilibrada”, esclarece.

Para Flávia, mesmo que os comunicadores admitam que não exista imparcialidade na imprensa, as concessões de rádio e TV, especialmente, precisam ser mais responsáveis com o que publicam. “Não se discute a reforma política, não se apresenta visões diferentes dos fatos. Nós somos pessoas que estão contra o golpe, que defendem uma virada à esquerda deste governo, mas não encontramos nenhum espaço na mídia”, acrescenta.

Segundo ela, a alternativa é usar as redes sociais de forma voluntária e colaborativa, ainda que para se contrapor aos grupos patrocinados pelo golpismo que dispõem de recursos que os comunicadores pelo Brasil nunca terão. “Não temos recursos, não temos poder econômico. E sabemos que as mensagens que eles veiculam no facebook ou no Whatsapp não são feita por amadores, que custam muito dinheiro. É uma luta de Davi contra Golias”, avalia.
 

Com as hashtags  #DilmaVireàEsquerda, para ser usada nesta sexta, e #RespeiteMeuVoto, para o domingo, o grupo afirma, no manifesto, que sua maior bandeira é o respeito e a luta pela liberdade de expressão. “O grupo não se furtará do dever de questionar a forma como os grandes veículos têm tratado a crise política, tão pouco da tarefa de oferecer uma visão alternativa dos protestos, em busca de oferecer – pelo menos nas redes sociais – material oposto àquele que certamente será oferecido pelas mídias hegemônicas”, diz o documento.