Mostrando postagens com marcador meios de comunicação. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador meios de comunicação. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

por que é preciso democratizar a mídia: a homogeneização ideológica - II

Em manifesto, economistas rejeitam ajuste fiscal como única via de política econômica


Revista Fórum, novembro 6, 2014 13:12
Em manifesto, economistas rejeitam ajuste fiscal como única via de política econômica

Para especialistas, imprensa tradicional quer impor política econômica que foi derrotada nas urnas
Por Redação
Um manifesto capitaneado por Maria Conceição Tavares, Luiz Gonzaga Belluzzo, Marcio Pochmann e outros pensadores da economia brasileira faz um contraponto ao que tem sido apregoado pelos meios de comunicação tradicionais no que diz respeito às políticas econômicas que o segundo mandato de Dilma Rousseff deve seguir.
Para eles, o resultado do processo eleitoral deixou claro que a maioria da população brasileira “rejeitou o retrocesso às políticas que afetam negativamente a vida dos trabalhadores e seus direitos sociais”. Criticam também aquilo que chamam de opinião única a respeito do rumo certo à economia brasileira divulgada por jornais e revistas.
“(…) os meios de comunicação propagaram quase exclusivamente a opinião que a austeridade fiscal e monetária é a única via para resolver nossos problemas. Isto vai na contramão da opinião de economistas de diferentes matizes no Brasil, mas reverbera o jogral dos porta-vozes do mercado financeiro. Estes defendem solucionar a desaceleração com a “credibilidade” da adesão do governo à austeridade fiscal e monetária, exigindo juros mais altos e maior destinação de impostos para o pagamento da dívida pública, ao invés de devolvê-los na forma de transferências sociais, serviços e investimentos públicos”, diz o manifesto.
Em outro momento, o manifesto também rejeita o argumento que relaciona gasto público e inflação. “Tampouco compreendemos o argumento que associa a inflação ao gasto público representado por desonerações que reduzem custos tributários e subsídios creditícios que reduzem custos financeiros. A inflação, aliás, manteve-se dentro da meta no governo Dilma Rousseff a despeito de notáveis choques de custos como a correção cambial, o encarecimento da energia elétrica e a inflação de commodities no mercado internacional”, criticam os economistas.
Os economistas se revelam preocupados com a “carência de bens públicos”. “O que nos preocupa é a possibilidade de recessão e a carência de bens públicos e infraestrutura social reclamada pela população brasileira. Atendê-la não é apenas um compromisso político em nome da inclusão social, é também uma fronteira de desenvolvimento, estímulo ao crescimento da economia e em seguida da própria arrecadação tributária”, analisam.

A seguir, confira o manifesto na íntegra:
“Economistas pelo desenvolvimento e pela inclusão social
A campanha eleitoral robusteceu a democracia brasileira através do debate franco sobre os rumos da Nação. Dois projetos disputaram o segundo turno da eleição presidencial. Venceu a proposta que uniu partidos e movimentos sociais favoráveis ao desenvolvimento econômico com redistribuição de renda e inclusão social. A maioria da população brasileira rejeitou o retrocesso às políticas que afetam negativamente a vida dos trabalhadores e seus direitos sociais.
É de se esperar que o pluralismo de opiniões fortaleça nossa democracia depois da pugna eleitoral. Desde 26 de outubro, contudo, a difusão de ideias deu a impressão de que existe um pensamento único no diagnóstico e nas propostas para os graves problemas da sociedade e da economia brasileira.
Sem o contraponto propiciado pela campanha e pelo horário eleitoral gratuito, os meios de comunicação propagaram quase exclusivamente a opinião que a austeridade fiscal e monetária é a única via para resolver nossos problemas. Isto vai na contramão da opinião de economistas de diferentes matizes no Brasil, mas reverbera o jogral dos porta-vozes do mercado financeiro. Estes defendem solucionar a desaceleração com a “credibilidade” da adesão do governo à austeridade fiscal e monetária, exigindo juros mais altos e maior destinação de impostos para o pagamento da dívida pública, ao invés de devolvê-los na forma de transferências sociais, serviços e investimentos públicos.
Subscrevemos que este tipo de austeridade é inócuo para retomar o crescimento e para combater a inflação em uma economia que sofre a ameaça de recessão prolongada e não a expectativa de sobreaquecimento.
O reforço da austeridade fiscal e monetária deprimiria o consumo das famílias e os investimentos privados, levando a um círculo vicioso de desaceleração ou mesmo queda na arrecadação tributária, menor crescimento econômico e maior carga da dívida pública líquida na renda nacional.
Entendemos que é fundamental preservar a estabilidade da moeda. Também somos favoráveis à máxima eficiência e ao mínimo desperdício no trato de recursos tributários: este tipo de austeridade, sim, denota espírito público e será sempre desejável. Rejeitamos, porém, o discurso dos porta-vozes do mercado financeiro que chama de “inflacionário” o gasto social e o investimento público em qualquer fase do ciclo econômico.
Tampouco compreendemos o argumento que associa a inflação ao gasto público representado por desonerações que reduzem custos tributários e subsídios creditícios que reduzem custos financeiros. A inflação, aliás, manteve-se dentro da meta no governo Dilma Rousseff a despeito de notáveis choques de custos como a correção cambial, o encarecimento da energia elétrica e a inflação de commoditiesno mercado internacional.
A austeridade agravou a recessão, o desemprego, a desigualdade e o problema fiscal nos países desenvolvidos mesmo tendo sido acompanhada por juros reais baixíssimos e desvalorização cambial. No Brasil, a apreciação cambial estimulada por juros reais altos aumenta o risco de recessão, ao acentuar a avalanche de importações que contribui para nosso baixo crescimento.
É essencial manter taxas de juros reais em níveis baixos e anunciar publicamente um regime fiscal comprometido com a retomada do crescimento, adiando iniciativas contracionistas, se necessárias, para quando a economia voltar a crescer. A atual proporção da dívida pública líquida na renda nacional não é preocupante em qualquer comparação internacional.
O que nos preocupa é a possibilidade de recessão e a carência de bens públicos e infraestrutura social reclamada pela população brasileira. Atendê-la não é apenas um compromisso político em nome da inclusão social, é também uma fronteira de desenvolvimento, estímulo ao crescimento da economia e em seguida da própria arrecadação tributária.
Esta opinião divergente expressa por parte importante dos economistas brasileiros não pode ser silenciada pela defesa acrítica da austeridade, como se o mantra que a louva representasse um pensamento único, técnico, neutro e competente.
Um dos vocalizadores desse mantra chegou a afirmar que um segundo governo Dilma Rousseff só seria levado a caminhar em direção à austeridade sob pressão substancial do mercado, o que chamou de “pragmatismo sob coação”.
Esperamos contribuir para que os meios de comunicação não sejam o veículo da campanha pela austeridade sob coação e estejam, ao contrário, abertos para o pluralismo do debate econômico em nossa democracia.
Maria da Conceição Tavares (UFRJ)
Luiz Gonzaga Belluzzo (UNICAMP e FACAMP)
Ricardo Bielschowsky (UFRJ)
Marcio Pochmann (UNICAMP)
Pedro Paulo Zahluth Bastos (UNICAMP)
Rosa Maria Marques (PUC-SP)
Alfredo Saad-Filho (SOAS – Universidade de Londres)
João Sicsú (UFRJ)Maria de Lourdes Mollo (UNB)
Vanessa Petrelli Corrêa (UFU)
Carlos Pinkusfeld Bastos (UFRJ)
Alexandre de Freitas Barbosa (USP)
Lena Lavinas (UFRJ)
Luiz Fernando de Paula (UERJ)
Hildete Pereira Melo (UFF)
Niemeyer Almeida Filho (UFU)
Frederico Gonzaga Jayme Jr. (UFMG)
Jorge Mattoso (UNICAMP)
Carlos Frederico Leão Rocha (UFRJ)
Rubens Sawaya (PUC-SP)
Fernando Mattos (UFF)
Pedro Rossi (UNICAMP)
Jennifer Hermann (UFRJ)
André Biancarelli (UNICAMP)
Bruno De Conti (UNICAMP)
Julia Braga (UFF)
Ricardo Summa (UFRJ)
William Nozaki (FESP)”

por que é preciso democratizar a mídia: a homogeneização ideológica - I

Dilma ratifica compromisso de democratizar a mídia 

Como mostram as mais de 80 linhas textuais publicadas hoje em O Globo, a chefe de Estado não tocou no assunto tangencialmente. 


Dario Pignotti @DarioPignotti Roberto Stuckert Filho/PR
Em sua condição de presidenta reeleita, Dilma Rousseff abordou pela primeira vez, e com argumentos substanciais, a necessidade de o Brasil debater e eventualmente sancionar um marco jurídico sobre os oligopólios que dominam a produção, circulação e consumo de notícias (privilégio que lhes permite pautar estratégias de desinformação em escala industrial).

Dilma citou as leis que foram aplicadas no Reino Unido contra crimes cometidos por um jornal do conglomerado de propriedade de Rupert Murdoch (uma espécie de Roberto Marinho nascido na Austrália e naturalizado britânico).

Falando para repórteres do jornal O Globo e de outras mídias privadas, a presidenta se referiu à necessidade de superar essa anomalia tipicamente brasileira, a "propriedade cruzada" de mídias eletrônicas e gráficas.

"Oligopólio e monopólio. Por que qualquer setor tem regulações e a mídia não pode ter?", questionou a presidenta diante dos jornalistas e deixou aberta uma potencial discussão sobre como vão se inserir as empresas de telecomunicação.

"Não só a propriedade cruzada. Tem inclusive um desafio, que é saber como fica a questão na área das mídias eletrônicas. O que é livre mercado total? Tenderá a ser a rede social, eu acho".

A presidenta que, em 2013, suspendeu uma visita de Estado a Washington em repúdio à espionagem perpetrada pela agência norte-americana NSA anunciou que impulsionará "um amplo debate a exemplo do que aconteceu com o marco civil da internet. Eu pretendo abrir um processo de discussão a partir do primeiro ou segundo trimestre do ano que vem".

Essas palavras revelam uma discussão política de fundo: iniciar a transição rumo à democracia midiática, o que seguramente vai alimentar a belicosidade do grupo Globo, o maior multimídia sul-americano, e de outras empresas defensoras do atual regime, que pode ser definido como "alegal", já que o Brasil é um dos poucos países onde não há legislação sobre propriedade cruzada.

Acontece que no Brasil impera um regime de exclusão social do espaço público que é pouco visto no resto do mundo, incluindo as potências ocidentais e países latino-americanos cujos governos compreenderam que para consolidar a democracia, em muitos casos recentes, era imprescindível alterar as condições de produção do campo informativo, o que implica desmontar estruturas concentradas e incorporar novos atores através de veículos públicos com generoso financiamento.

E para avançar na matéria, é básico contar com um marco jurídico que regule o sistema. Sem lei, impera a barbárie do mercado jornalístico.

Outra diferença: Enquanto no Brasil o sistema estatal e público é pouco competitivo com as empresas privadas, em outros paises como o Reino Unido e Italia, existem poderosas empresas públicas como BBC e RAI com real capacidade de disputa frente a grupos tentaculares, oligopólicos, como o  controlado por Murdoch ou o multimídia de Silvio Berlusconi.


Dilma cumpre

Durante a campanha encerrada com a vitória de 26 de outubro, Dilma havia dado sinais de sua intenção de abordar um tema espinhoso para o qual deu pouca atenção nos primeiros quatro anos de seu mandato. Por sua vez, o candidato do setor conservador Aécio Neves se posicionou contra qualquer regulamentação, assumindo como seu o discurso das empresas e da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert).

Antes do primeiro turno de 5 de outubro, a candidata do PT concedeu entrevista a vários blogueiros que não se sujeitam à censura do mercado. Foi a primeira vez que a presidenta recebeu a imprensa "independente", no sentido cabal do termo, na residência oficial da Alvorada, reconhecendo seu status político e institucional.

"Uma coisa não tem nada a ver com a outra [regulação econômica e controle de conteúdo]. Regular conteúdo é de país ditatorial. Na regulação econômica vamos impedir que relações oligopólicas se estabeleçam e se instalem. É óbvio que nada tem de bolivariano nisso", disse em 25 de setembro, quando também prometeu que, ao ser eleita, retomaria o assunto.

Semanas mais tarde, poucos dias antes do segundo turno, Dilma e o PT denunciaram as manobras perpetradas pela Veja e adiantaram a intenção de levar o caso à justiça por considerar que a revista da Editora Abril cometera ações criminosas.

Promessas cumpridas

A novidade surgida da entrevista desta quinta-feira concedida ao Globo, Folha de S.Paulo, Estado de S. Paulo e Valor Econômico é que dois meses antes de assumir seu segundo mandato, a presidenta ratificou sua promessa de campanha de revisar o status quo informativo.

Detalhe: a chefe de Estado não tocou no assunto tangencialmente, ou por compromisso em resposta a uma pergunta, mas demonstrou real interesse em assumir o assunto durante alguns minutos, como mostram as mais de 80 linhas textuais publicadas hoje na página 4 do jornal O Globo.

Claro que as grandes mídias matutinas evitaram colocar em destaque a decisão de impulsionar a democracia comunicacional, assunto que, na opinião deste articulista, foi a principal notícia da entrevista. Ao contrário, os jornais hegemônicos preferiram, no geral, destacar que Dilma caminharia rumo a um inevitável ajuste neoliberal.

Com títulos surgidos do que podemos chamar de "pensamento jornalístico único", O Globo, Estado de S. Paulo e Folha de S.Paulo  publicaram, respectivamente, "Dilma diz que vai a controlar gastos e controlar a inflação", "Dilma diz que fará 'dever de casa' contra inflação" e "Dilma sugere contenção de gasto e cerco à inflação". Interessante exemplo de como a propriedade concentrada deriva em homogeneidade ideológica.

A maioria dos jornais não deram a devida importância à fala de Dilma sobre a "dura" legislação inglesa contra as irregularidades jornalísticas, e o julgamento contra o tablóide News of the World, forçado a encerrar suas atividades após o escândalo de escutas ilegais em 2011.
No contexto da guerra suja contra Dilma montada especialmente pelos principais veículos privados se torna inevitável estabelecer um paralelo entre os abusos do britânico News of the World e os excessos cometidos pela Veja desde a quinta 23 de outubro para sabotar a quarta vitória consecutiva do PT.
Como no Brasil, por enquanto, existe o vazio jurídico absoluto , está garantida a impunidade dos patrões e dos editores da publicação semanal da família Civita.

Do contrário, se tivéssemos alguma norma que impusesse limites à realidade hobbessiana da mídia, é possível que os responsáveis pela Veja fossem processados, como foi Rebeca Brooks, mão direita do multimilionário Murdoch, junto de Andy Coulson, ex-porta-voz do premiê britânico David Cameron.
___________

Dario Pignotti é repórter do diário argentino Página 12 e doutor em Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP).

A tradução é de Daniella Cambaúva.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

A nova mídia velha: dois casos

Fonte: Diário do Centro do Mundo

A agonia da Abril

Paulo Nogueira, 3 de agosto de 2013

Ao contrário de outras crises da mídia impressa, desta vez o caso é terminal.

A comunidade jornalística está em estado de choque pela carnificina editorial ocorrida na Editora Abril.
Nos tempos em que as revistas tinham futuro, na década de 1980
Nos tempos em que as revistas tinham futuro, na década de 1980
Mas eis uma agonia anunciada.
Revistas – a mídia que fez a grandeza da Abril – estão tecnicamente mortas, assassinadas pela internet.

Os leitores somem em alta velocidade. Quando você vê alguém lendo revistas (ou jornal) num bar ou restaurante, repare na idade.

Jovens estão com seus celulares ou tablets conectados no noticiário em tempo real.
Perdidos os usuários, foi-se também a publicidade. Em países como Inglaterra e Estados Unidos, a mídia digital já deixou a mídia impressa muito para trás em faturamento publicitário.

E no Brasil, ainda que numa velocidade menor, o quadro é exatamente o mesmo. Que anunciante quer vincular sua marca a um produto obsoleto, consumido por pessoas “maduras”.

Apenas para lembrar, no mundo das revistas, nunca, em lugar nenhum, funcionou publicitariamente revista para o público “maduro”.

Sucessivas revistas para mulheres “de meia idade” em diversos países fracassaram à míngua de anúncios. O anunciante quer o jovem no auge do consumo. É um fato.

Crises as editoras de revistas enfrentaram muitas. Mas esta é diferente. Desta vez, o caso é terminal.
Antes, e eu vivi várias crises em meus anos de Abril, você sabia que uma hora a borrasca ia passar.
Agora, você olha para a frente e observa apenas o cemitério.

Sobrarão, no futuro, algumas revistas – mas poucas, e de circulação restrita porque serão um hábito quase tão extravagante quanto se movimentar em carruagem.

Na agonia, o que companhias como a Abril farão é seguir a cartilha clássica: tentar extrair o máximo de leite da vaca destinada a morrer.

Para isso, você enxuga as redações, corta os borderôs, piora o papel, diminui as páginas editoriais e, se possível, aumenta o preço.

É uma lógica que vale mesmo para títulos como Veja e Exame, os mais fortes da Abril. Foi demitido, por exemplo, o correspondente da Veja em Nova York, André Petry.

Grandes revistas da Abril, como a Quatro Rodas, passaram agora a não ter mais diretor de redação.
Em breve deixará de fazer sentido uma empresa que encolhe ficar num prédio como o que a Abril ocupa na Marginal do Pinheiros, cujo aluguel é calculado entre 1 e 2 milhões de reais por mês.

É inevitável, neste processo, que a empresa perca o poder de atrair talentos. Quem quer trabalhar num ramo em extinção?

Os funcionários mais ousados tratarão de sair, em busca de carreiras em setores que florescem.
Ao contrário de crises anteriores para a mídia impressa, esta é, simplesmente, terminal.

Corre o boato de que a empresa será vendida. Mas quem compra uma editora de revistas a esta altura? Recentemente, no Reino Unido, correu o boato de que o proprietário dos títulos Evening Standard e Independent estaria vendendo seus jornais. Numa entrevista, isso lhe foi perguntado por um jornalista. “Mas quem está comprando jornais?”, devolveu ele.

É um cenário desolador – e não só para a Abril como, de um modo geral, para toda a mídia tradicional, incluída a televisão.

A internet é uma mídia que se classifica como disruptora: ela simplesmente mata. O futuro da tevê está muito mais na Netflix ou no Youtube do que na Globo.

As empresas de mídia estão buscando alternativas para sobreviver. A News Corp, de Murdoch, separou recentemente suas divisões de entretenimento e de mídia, para que a segunda não contamine a primeira.

A própria Abril vai saindo das revistas e tentando um lugar ao sol na educação.

Mas escolas – supondo que a Abril supere o problema dramático de imagem da Veja, pois isso vai levar muitos pais a recusar dar a seus filhos uma educação suspeita de contaminação pela Veja – não dão prestígio e nem dinheiro como as revistas deram ao longo de tantos anos.

Isso quer dizer que a Abril luta pela vida. Mas uma vida muito menos influente e glamorosa do que a que teve sob Victor Civita, primeiro, e Roberto Civita, depois.

 

 ***

O iceberg tenta resgatar o Titanic: a compra do Washington Post pelo dono da Amazon

Kiko Nogueira, 6 de agosto de 2013
 
Jeff Bezos pagou US$ 250 milhões (um quarto do que custou o Instagram) pelo jornal que deu o furo de ‘Watergate’.

A notícia da compra do Washington Post pelo empresário Jeff Bezos, dono da Amazon, causou um terremoto na mídia americana. Bezos pagou 250 milhões de dólares de um fundo que usa para explorações científicas chamado Expeditions. A família Graham era dona do Post desde 1946. Katharine Weymouth, a atual publisher, se declarou entusiasmada com o negócio. O WaPo, como é apelidado, é responsável pelas reportagens sobre Watergate, que causaram a queda de Richard Nixon. Weymouth falou da capacidade de Bezos de conduzir a publicação “para um futuro digital”. Ela permanecerá no cargo, por enquanto.
jeff
Bezos
Ferido de morte pela Internet, o Post foi vendido por um quarto do valor desembolsado pelo Tumblr e pelo Instagram (e pelo mesmo que um colecionador pagou por um quadro de Cézanne há dois anos).

Os jornalistas estão atônitos. O iceberg (a Internet) resgatou o Titanic (a velha mídia)? Foram pegos de surpresa (um dia antes do anúncio oficial, o New York Times publicou um perfil de Weymout em que nada disso foi mencionado). Vários colunistas da casa se manifestaram. Um deles, Ezra Klein, finalizou seu artigo resumindo o sentimento geral: “Estou esperançoso”.

Aos 49 anos, Bezos tem uma fortuna pessoal calculada em 22 bilhões de dólares. É um liberal que apoia causas como o casamento gay. Tem fama de controlador e perfeccionista. Testemunhas falam de reuniões que só começam depois de leituras silenciosas de longos memorandos de seis páginas. Na carta aos funcionários, escreveu o seguinte: “Haverá, claro, mudanças no Post nos próximos anos. É essencial e teria acontecido com ou sem um novo proprietário. A Internet está transformando quase todos os elementos do negócio da notícia: encurtando o ciclo delas, erodindo fontes de financiamento antigas e permitindo o surgimento de novos competidores”.

Bezos está sendo encarado com a grande esperança branca. Carl Bernstein, que junto com Bob Woodward produziu as matérias do Watergate, acredita que Bezos vai combinar “as melhores sensibilidades da velha e da nova era”.

Mas a verdade é que Bezos não é uma instituição benemerente e fará o que a família não quer mais fazer: cortar. Ou, em tucanês, promover uma “reestruturação”. Isso significa demitir pessoas, diminuir salários etc.

O Washington Post perdeu relevância e dinheiro de maneira dramática nos últimos anos. O prejuízo em 2012 foi cinco vezes maior que o de 2010. Mudaram de endereço para um prédio menor.

Fecharam escritórios em outras cidades. Mas a sangria não foi desatada. Em seu comunicado oficial, o CEO Donald Graham (tio de Katharine Weymouth) admitiu que os lucros “têm diminuído há sete anos. Nós inovamos, e na minha visão nossas inovações foram bem sucedidas em termos de audiência e qualidade, mas não foram suficientes para deter o declínio do faturamento”.

A negociação é um sinal dos tempos. Um bilionário do Vale do Silício assume um jornal com mais de 100 anos de idade. Não se sabe no que vai dar. Mas Jeff Bezos vai fazer o que tem de ser feito no velho Washington Post — e a família Graham estará assistindo, enquanto o sangue escorre.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

As coberturas de eventos: quem cobre o quê? Por quê? Pra quê?...


O jovem que a TV esconde  

Para que o telespectador possa comparar os programas e escolher os que lhe interessam é fundamental que emissoras públicas e privadas estejam lado a lado, com apenas um ‘zap’ entre elas

Por: Lalo Leal

Publicado em 16/02/2013


Cerca de 4 mil jovens circulam pelo campus da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) na manhã de um sábado de verão. Festival de risos, músicas, mochilas e colchonetes.

Estão ali para participar do 14º Coneb, o Conselho Nacional de Entidades de Base, da União Nacional de Estudantes (UNE). Havia gente que levou dois ou três dias para chegar a Recife, como os que saíram do interior do Amapá, usando barcos e ônibus como transporte.

Durante três dias vão discutir os rumos da educação brasileira e, de quebra, a luta pela democratização da mídia. Nada mais pertinente e necessário. O próprio encontro é o melhor exemplo dessa necessidade, praticamente ignorado pelos grandes meios de comunicação.

O número de participantes, os convidados presentes (autoridades públicas e especialistas) e os temas justificam a inclusão do encontro em qualquer cobertura jornalística séria. Não foi o que ocorreu. Abro dois grandes jornais de Pernambuco no domingo, e nada. Nos do Rio e São Paulo nem sombra do encontro.

Televisões presentes só as públicas: TV Brasil e TV Pernambuco. Fato que ressalta a importância desses veículos na luta contra o bloqueio dos meios privados aos movimentos sociais, como o estudantil.

Uma cobertura ao vivo no campus da UFPE poderia render ótimas histórias. Além do conteúdo dos debates, as vivências daqueles estudantes com diferentes sotaques mostrariam ao telespectador um jovem comprometido com seu país, bem diferente dos que aparecem todos os dias nas novelas.

Coincidindo com o evento da UNE, foi implementada a Empresa Pernambuco de Comunicação, gestora da TV pública local. Embora vinculada ao governo do estado, é gerida por um conselho autônomo que segue em linhas gerais os padrões adotados pela Empresa Brasil de Comunicação. São tentativas promissoras de tornar esses veículos mais públicos e menos estatais.

No caso de Pernambuco, o processo levou mais de três anos, num debate aberto com ampla participação da sociedade. A TV já existia, mas estava sucateada. Foi criada em 1984 e, durante os governos pós-ditadura de Miguel Arraes (1987-1990 e 1995-1999), tornou-se um importante veículo de informação e entretenimento. Abandonada na gestão Jarbas Vasconcelos (1999-2006), tem agora possibilidades de se reerguer.

São passos importantes mas ainda preliminares para a constituição no país de um serviço público de rádio e televisão capaz de competir com a mídia comercial. Um dos obstáculos mais sérios, além de uma destinação constante e consistente de recursos, está na forma de o telespectador sintonizar essas emissoras.

O espectro eletromagnético por onde trafegam as ondas de rádio e TV foi praticamente privatizado. Em Recife, a TV Pernambuco pode ser vista no canal 46 (UHF). Até o governo Jarbas era possível ver a emissora estatal em VHF, no canal 9, ao lado das grandes redes comerciais. Mas a concessão foi perdida e ocupada, rapidamente, pela Bandeirantes.

O fato se repete em outros estados. Com a digitalização prevista para os próximos anos, o problema pode ser minimizado, mas não resolvido. As grandes redes comerciais continuarão a ser sintonizadas nos canais de números baixos (hoje vão do 2 ao 13), restando os mais longínquos para as redes públicas.

Para que o telespectador possa comparar os programas e escolher os que lhe interessam é fundamental que públicas e privadas estejam lado a lado. Não são tantas as TVs comerciais para mostrar praticamente a mesma coisa? Então deveremos ter muitas públicas, para mostrar nossas múltiplas realidades.

Só assim será possível cobrir ao vivo, com competência e detalhamento, um evento como o realizado em Recife pela UNE. Dessa forma, o estereótipo do jovem consumista e alienado será, no mínimo, relativizado.  

domingo, 16 de dezembro de 2012

Liberdade de escolha quando a pauta é única?



Quando o controle remoto não resolve 

Lalo Leal  

Em que pese a importância das redes sociais e da internet para o debate sobre as virtudes e defeitos dos meios de comunicação, nas universidades a crítica definha




Publicado em 13/12/2012


Jornais, revistas, o rádio e a televisão tratam de quase tudo sem restrição. Apenas um assunto é tabu: eles mesmos. Se hoje a internet tem papel relevante nesse debate sobre a mídia, na academia houve retrocesso. O programa Globo Univer­sidade, das Organizações Globo, tem parcela importante de responsabilidade nessa mudança. Surgiu com o objetivo de neutralizar aquela que era uma das poucas áreas em que se realizava uma análise crítica sistemática dos meios de comunicação. Passou a financiar laboratórios de pesquisa e eventos científicos e, com isso, um objeto de investigação, no caso a própria Globo, tornou-se patrocinador do investigador, retirando da pesquisa a necessária isenção. Fez na comunicação o que a indústria farma­cêutica faz com a medicina, bancando viagens e congressos médicos para propa­gandear remédios.

O resultado prático pode ser visto no número crescente de trabalhos acadêmicos sobre o uso de novas tecnologias associadas à TV e as formas de aplicação de seus resultados pelo mercado. Enfatizam cada vez mais o papel do receptor como elemento capaz de selecionar, a seu critério, os conteúdos que lhe interessam. Fazem, dessa forma, o jogo dos controladores dos meios, retirando deles a responsabilidade por aquilo que é veiculado. Fica tudo nas costas do pobre receptor. Esquecem o fenômeno da concentração dos meios que reduz o mundo a uma pauta única, com pouca diferenciação entre os veículos.

Dizem em linguagem empolada o que empresários de TV costumam expressar de modo simples: “O melhor controle é o controle remoto”. Como se ao mudar de canal fosse possível ver algo muito diferente.

Cresce também o número de empresas de comunicação que oferecem cursos até em universidades públicas, retirando dessas instituições o espaço do debate e da crítica. Saem dos cursos de comunicação jovens adestrados para o mercado, capazes de se tornar bons profissionais. No entanto, a débil formação geral recebida os impedirá de pôr os conhecimentos obtidos a serviço da cidadania e da transformação social.

O papel político desempenhado pelos meios de comunicação e a análise criteriosa dos conteúdos emitidos ficam em segundo plano, tanto na pesquisa como no ensino. Foi-se o tempo em que, logo dos primeiros anos do curso, praticava-se a comunicação comparada, com exercícios capazes de identificar as linhas político-editoriais adotadas pelos diferentes veículos. Caso fosse aplicada hoje, mostraria, com certeza, a uniformidade das pautas, com jornais e telejornais reduzindo os acontecimentos a meia dúzia de fatos capazes de “render matéria”. Mas poderia, em alguns momentos excepcionais, realçar diferenças significativas, imperceptíveis aos olhos do receptor comum.

Como no caso ocorrido logo após a condenação de José Dirceu pelo STF. Ao sair de uma reunião, o líder do PT na Câmara dos Deputados, Jilmar Tatto, foi abordado por vários repórteres. Queriam saber sua opinião sobre o veredicto do Supremo. Claro que ele deu apenas uma resposta, mas para quem viu os telejornais da Rede TV e da Globo foram respostas diferentes. Na primeira Tatto dizia: “A Corte tem autonomia soberana e pagamos alto preço por isso. E só espero que essa jurisprudência usada pelo STF continue e que tenha o mesmo tratamento com os acusados do PSDB”. Na Globo a frase sobre o “mensalão tucano” desapareceu.

Em casa o telespectador, mesmo vendo os dois jornais, dificilmente perceberia a diferença entre ambos, dada a sequência rápida das imagens. Mas para a universidade seria um excelente mote de pesquisa cujos resultados teriam uma importância sociopolítica muito maior do que longos discursos sobre transmídias e receptores. 

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Mídia: liberdade e regulação - é possível, desejável? O caso britânico

 
Internacional| 29/11/2012 | Copyleft

Comissão anuncia hoje medidas sobre regulação da mídia na Inglaterra

A imprensa britânica tem nesta quinta-feira seu dia D. A Comissão Leveson, nomeada pelo governo para investigar a imprensa à luz do escândalo das escutas telefônicas, divulgará seu informe e suas recomendações. Ninguém sabe se a comissão se inclinará por uma forma mais estrita de autoregulação ou pela criação de um ente regulador independente, mas a proximidade do anúncio já gerou uma forte ofensiva midiática.




Londres - A imprensa britânica tem nesta quinta-feira seu dia D. A Comissão Leveson, nomeada pelo governo para investigar a imprensa escrita à luz do escândalo das escutas telefônicas, divulgará seu informe e suas recomendações. Ninguém sabe se a comissão se inclinará por uma forma mais estrita de autoregulação da imprensa ou pela criação de um ente regulador independente, mas a proximidade do anúncio já gerou uma forte ofensiva midiática “em favor da liberdade de expressão e de imprensa” e contra jornalistas favoráveis a um forte esquema regulatório. A própria coalizão governamental conservadora-liberal democrata aparece dividida e pode apresentar sua reação ao informe por separado.

O escândalo das escutas tem sete condenados, 14 processados, mais de 40 pessoas livres sob fiança, umas 600 vítimas identificadas, um jornal fechado e dezenas de acertos extrajudiciais como as 200 mil libras (mais de 300 mil dólares) que a News International pagou ao ator Jude Law ou as 63 mil (ao redor de 100 mil dólares) que pagou ao ex-vice-primeiro ministro trabalhista John Prescott. Mas tanto os meios de comunicação como o governo estarão interessados em outra coisa. O escândalo, que começou em 2005, com denúncias de escuta ilegal ao príncipe Guilherme, se tornou irresistível em julho do ano passado quando se soube que o “News of the World” havia invadido o celular de uma adolescente desaparecida para obter informações.

O primeiro ministro David Cameron duvidou, mas a indignação coletiva e uma catarata de novas denúncias que afetavam já não mais famosos, mas sim gente comum que havia virado tema do noticiário (vítimas de violações, familiares das vítimas de atentados terroristas ou de soldados mortos no Afeganistão e no Iraque) fizeram com que ele fosse forçado a criar uma comissão para investigar a “prática e a cultura da imprensa” e a propor medidas que evitassem uma repetição desses fatos.

O primeiro ministro anunciará sua reação nesta quinta-feira à tarde, algumas horas após a apresentação do informe. Os analistas políticos britânicos estimam que após receber testemunhos durante 9 meses de dezenas de políticos, celebridades e vítimas das escutas a Comissão Leveson se verá obrigada a propor algum tipo de regulação dos meios de comunicação. “A menos que a comissão sucumba à retórica crua empregada por alguns jornais, o mais provável é que proponha uma modesta regulação da imprensa”, assinalou no “The Independent” o comentarista Steve Richards. Qualquer que seja a recomendação, Cameron tem duas opções: aceitá-la plenamente ou agradecer os serviços prestados dizendo que incorporará a sugestão em uma proposta do governo.

No primeiro caso, se a proposta contiver um sistema regulatório independente, Cameron provocará a fúria dos mesmos meios de comunicação que procurou conquistar desde que se converteu em líder do Partido Conservador em 2005. A relação com o poderoso grupo Murdoch, deteriorada ao máximo por sua decisão de criar a Comissão Leveson, se tornará irreparável. Outros setores da imprensa conservadora majoritária, impacientes com as idas e vindas de seu governo, aprofundarão suas críticas. Em caso de agradecer pelos serviços prestados, aparecerá ante a opinião pública como escravo dos grandes grupos midiáticos, ficando exposto ao Partido Trabalhista, que está a favor de um marco regulatório independente, e à hostilidade de celebridades do calibre do ator Hugh Grant.

A pressão de alguns meios de comunicação foi feroz. “Os jornais estão em guerra. Criticaram, ridicularizaram e tentaram minar a Comissão Leveson. Trataram de enlamear o nome de supostos inimigos da liberdade de imprensa que simplesmente estavam a favor de um sistema regulatório”, assinalou segunda-feira um editorial do The Guardian. Entre os meios de direita – e também para Cameron a campanha se inscreve no marco de um rechaço a toda regulação e intervenção do Estado na vida social. Mas o tema é complexo. Os conservadores estão divididos entre os que preferem um sistema autoregulatório muito mais duro do que o atualmente existente e os que querem um ente regulatório independente. O próprio The Guardian não descarta a ideia de uma autoregulação que contenha em seu interior suficientes garantias de independência para que não se repitam os abusos do passado. O juiz Brian Leveson, que preside a Comissão, e o primeiro ministro David Cameron têm a palavra nesta quinta-feira.

Tradução: Katarina Peixoto