O jovem que a TV esconde
Para que o telespectador possa comparar os programas e
escolher os que lhe interessam é fundamental que emissoras públicas e
privadas estejam lado a lado, com apenas um ‘zap’ entre elas
Por: Lalo Leal
Publicado em 16/02/2013
Fonte: Revista do Brasil
Cerca de 4
mil jovens circulam pelo campus da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE) na manhã de um sábado de verão. Festival de risos, músicas,
mochilas e colchonetes.
Estão ali
para participar do 14º Coneb, o Conselho Nacional de Entidades de
Base, da União Nacional de Estudantes (UNE). Havia gente que levou
dois ou três dias para chegar a Recife, como os que saíram do
interior do Amapá, usando barcos e ônibus como transporte.
Durante
três dias vão discutir os rumos da educação brasileira e, de
quebra, a luta pela democratização da mídia. Nada mais pertinente
e necessário. O próprio encontro é o melhor exemplo dessa
necessidade, praticamente ignorado pelos grandes meios de
comunicação.
O número
de participantes, os convidados presentes (autoridades públicas e
especialistas) e os temas justificam a inclusão do encontro em
qualquer cobertura jornalística séria. Não foi o que ocorreu. Abro
dois grandes jornais de Pernambuco no domingo, e nada. Nos do Rio e
São Paulo nem sombra do encontro.
Televisões
presentes só as públicas: TV Brasil e TV Pernambuco. Fato que
ressalta a importância desses veículos na luta contra o bloqueio
dos meios privados aos movimentos sociais, como o estudantil.
Uma
cobertura ao vivo no campus da UFPE poderia render ótimas histórias.
Além do conteúdo dos debates, as vivências daqueles estudantes com
diferentes sotaques mostrariam ao telespectador um jovem comprometido
com seu país, bem diferente dos que aparecem todos os dias nas
novelas.
Coincidindo
com o evento da UNE, foi implementada a Empresa Pernambuco de
Comunicação, gestora da TV pública local. Embora vinculada ao
governo do estado, é gerida por um conselho autônomo que segue em
linhas gerais os padrões adotados pela Empresa Brasil de
Comunicação. São tentativas promissoras de tornar esses veículos
mais públicos e menos estatais.
No caso de
Pernambuco, o processo levou mais de três anos, num debate aberto com
ampla participação da sociedade. A TV já existia, mas estava
sucateada. Foi criada em 1984 e, durante os governos pós-ditadura de
Miguel Arraes (1987-1990 e 1995-1999), tornou-se um importante
veículo de informação e entretenimento. Abandonada na gestão
Jarbas Vasconcelos (1999-2006), tem agora possibilidades de se
reerguer.
São
passos importantes mas ainda preliminares para a constituição no
país de um serviço público de rádio e televisão capaz de
competir com a mídia comercial. Um dos obstáculos mais sérios,
além de uma destinação constante e consistente de recursos, está
na forma de o telespectador sintonizar essas emissoras.
O espectro
eletromagnético por onde trafegam as ondas de rádio e TV foi
praticamente privatizado. Em Recife, a TV Pernambuco pode ser vista
no canal 46 (UHF). Até o governo Jarbas era possível ver a emissora
estatal em VHF, no canal 9, ao lado das grandes redes comerciais. Mas
a concessão foi perdida e ocupada, rapidamente, pela Bandeirantes.
O fato se
repete em outros estados. Com a digitalização prevista para os
próximos anos, o problema pode ser minimizado, mas não resolvido.
As grandes redes comerciais continuarão a ser sintonizadas nos
canais de números baixos (hoje vão do 2 ao 13), restando os mais
longínquos para as redes públicas.
Para que o
telespectador possa comparar os programas e escolher os que lhe
interessam é fundamental que públicas e privadas estejam lado a
lado. Não são tantas as TVs comerciais para mostrar praticamente a
mesma coisa? Então deveremos ter muitas públicas, para mostrar
nossas múltiplas realidades.
Só assim
será possível cobrir ao vivo, com competência e detalhamento, um
evento como o realizado em Recife pela UNE. Dessa forma, o
estereótipo do jovem consumista e alienado será, no mínimo,
relativizado.
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