domingo, 24 de fevereiro de 2013

As coberturas de eventos: quem cobre o quê? Por quê? Pra quê?...


O jovem que a TV esconde  

Para que o telespectador possa comparar os programas e escolher os que lhe interessam é fundamental que emissoras públicas e privadas estejam lado a lado, com apenas um ‘zap’ entre elas

Por: Lalo Leal

Publicado em 16/02/2013


Cerca de 4 mil jovens circulam pelo campus da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) na manhã de um sábado de verão. Festival de risos, músicas, mochilas e colchonetes.

Estão ali para participar do 14º Coneb, o Conselho Nacional de Entidades de Base, da União Nacional de Estudantes (UNE). Havia gente que levou dois ou três dias para chegar a Recife, como os que saíram do interior do Amapá, usando barcos e ônibus como transporte.

Durante três dias vão discutir os rumos da educação brasileira e, de quebra, a luta pela democratização da mídia. Nada mais pertinente e necessário. O próprio encontro é o melhor exemplo dessa necessidade, praticamente ignorado pelos grandes meios de comunicação.

O número de participantes, os convidados presentes (autoridades públicas e especialistas) e os temas justificam a inclusão do encontro em qualquer cobertura jornalística séria. Não foi o que ocorreu. Abro dois grandes jornais de Pernambuco no domingo, e nada. Nos do Rio e São Paulo nem sombra do encontro.

Televisões presentes só as públicas: TV Brasil e TV Pernambuco. Fato que ressalta a importância desses veículos na luta contra o bloqueio dos meios privados aos movimentos sociais, como o estudantil.

Uma cobertura ao vivo no campus da UFPE poderia render ótimas histórias. Além do conteúdo dos debates, as vivências daqueles estudantes com diferentes sotaques mostrariam ao telespectador um jovem comprometido com seu país, bem diferente dos que aparecem todos os dias nas novelas.

Coincidindo com o evento da UNE, foi implementada a Empresa Pernambuco de Comunicação, gestora da TV pública local. Embora vinculada ao governo do estado, é gerida por um conselho autônomo que segue em linhas gerais os padrões adotados pela Empresa Brasil de Comunicação. São tentativas promissoras de tornar esses veículos mais públicos e menos estatais.

No caso de Pernambuco, o processo levou mais de três anos, num debate aberto com ampla participação da sociedade. A TV já existia, mas estava sucateada. Foi criada em 1984 e, durante os governos pós-ditadura de Miguel Arraes (1987-1990 e 1995-1999), tornou-se um importante veículo de informação e entretenimento. Abandonada na gestão Jarbas Vasconcelos (1999-2006), tem agora possibilidades de se reerguer.

São passos importantes mas ainda preliminares para a constituição no país de um serviço público de rádio e televisão capaz de competir com a mídia comercial. Um dos obstáculos mais sérios, além de uma destinação constante e consistente de recursos, está na forma de o telespectador sintonizar essas emissoras.

O espectro eletromagnético por onde trafegam as ondas de rádio e TV foi praticamente privatizado. Em Recife, a TV Pernambuco pode ser vista no canal 46 (UHF). Até o governo Jarbas era possível ver a emissora estatal em VHF, no canal 9, ao lado das grandes redes comerciais. Mas a concessão foi perdida e ocupada, rapidamente, pela Bandeirantes.

O fato se repete em outros estados. Com a digitalização prevista para os próximos anos, o problema pode ser minimizado, mas não resolvido. As grandes redes comerciais continuarão a ser sintonizadas nos canais de números baixos (hoje vão do 2 ao 13), restando os mais longínquos para as redes públicas.

Para que o telespectador possa comparar os programas e escolher os que lhe interessam é fundamental que públicas e privadas estejam lado a lado. Não são tantas as TVs comerciais para mostrar praticamente a mesma coisa? Então deveremos ter muitas públicas, para mostrar nossas múltiplas realidades.

Só assim será possível cobrir ao vivo, com competência e detalhamento, um evento como o realizado em Recife pela UNE. Dessa forma, o estereótipo do jovem consumista e alienado será, no mínimo, relativizado.  

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