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terça-feira, 3 de março de 2015

Google: de oráculo a vórtice

Quando o Google encontrou o WikiLeaks

Julian Assange

Fev/2015
R$ 39,00


Julian Assange conta seu encontro com Eric Schmidt, presidente do Google, discutindo os problemas políticos enfrentados pela sociedade – da Primavera Árabe ao Bitcoin – e as respostas tecnológicas geradas pela rede global para esses dilemas.

Depois da publicação de Cypherpunks: liberdade e o futuro da internet e há mais de dois anos asilado na Embaixada do Equador em Londres, Julian Assange, fundador e editor do WikiLeaks, lança no Brasil seu segundo e mais recente livro, Quando o Google encontrou o WikiLeaks. Ao longo de 168 páginas, Assange discute as consequências da acumulação de poder pelo Google no século XXI e relata seu encontro com Eric Schmidt, presidente do grupo, em 2011. O resultado é um livro fascinante e alarmante, que revela os polos opostos em que esses dois personagens icônicos da atual “era tecnológica” se encontram e suas opiniões divergentes sobre o destino do mundo e das novas tecnologias.

Assange foi procurado pelo executivo quando cumpria prisão domiciliar em Norfolk, na Inglaterra. Na época, o Google estava a caminho de se tornar a empresa mais influente do planeta pelas mãos de Schmidt, uma pessoa de natureza analítica e inteligência sistemática. Ambos debateram questões contemporâneas – da Primavera Árabe ao Bitcoin – e as respostas tecnológicas surgidas na rede global para os atuais dilemas sociopolíticos. Para Assange, o potencial libertador da Internet é baseado na ausência de poder estatal. Schmidt, por outro lado, defende que sejam levadas em conta questões de política externa e as relações entre governo e empresas de tecnologia. Tais diferenças estão no cerne de uma disputa ideológica acirrada sobre o futuro da internet, que só se intensificou com os anos.

O livro traz um alerta sobre a natureza ambivalente das tecnologias de informação e comunicação e lembra que redes digitais e seus dispositivos não são neutros. “Assange liga nomes, fatos e instituições, deixando evidente que o Google não é uma mera empresa inovadora que distribui aplicativos e constrói plataformas para nos alegrar e nos permitir fazer mais por nós mesmos. O Google se tornou uma corporação que integra o sistema de controle, vigilância e expansão do poder do Estado norte-americano”, analisa o sociólogo Sérgio Amadeu da Silveira, na apresentação. “Muitas pessoas pensam que o mundo da tecnologia é o mundo da ausência de relações de poder. Este livro mostra que elas estão enganadas. O poder não se faz por meio da tecnologia somente, mas está embutido na própria tecnologia.”

O Google não é a única empresa cujo posicionamento no mercado tem possibilitado um enorme poder político, mas é um exemplo dos perigos da internet corporativa. “Desde muito cedo, seus fundadores perceberam que o processamento de informações em grande escala os colocaria no centro de tudo”, afirma Assange. “À medida que cresce o monopólio do Google na área de busca e serviços de internet, e ele estende a vigilância industrial para a maior parte da população do planeta, dominando rapidamente o mercado de telefonia móvel e apressando?se para ampliar o acesso à internet no hemisfério sul, ele se torna praticamente a própria internet para muitas pessoas. A influência do Google sobre as escolhas e o comportamento de todos os seres humanos se traduz em um poder concreto de influenciar o rumo da história.”

O livro ganhou destaque na imprensa internacional, noticiado em jornais como The Guardian e The Independent, por fazer parte da empreitada de Assange para revolucionar as formas de acesso à informação. Quando o Google encontrou o WikiLeaks apresenta a conversa entre Schmidt e Assange em forma de diálogo transcrito, e inclui ainda um prefácio redigido pelo fundador do WikiLeaks especialmente para a edição brasileira.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Os sitemas de controle, o descontrole, Charlie Hebdo

Assange: 'O serviço secreto francês tem muitas perguntas para responder'

Em entrevista à Carta Maior, Julian Assange falou sobre vigilância massiva e as relações dos serviços secretos internacionais com os atentados de Paris.


Marcelo Justo - exclusivo para Carta Maior
 
Ars Electronica / Flickr
Londres - A interpretação do massacre da Charlie Hebdo se transformou em um território em disputa. A liberdade de expressão e a relação com a minoria muçulmana, a dicotomia entre multiculturalismo à britânica ou integração secular à francesa, a luta antiterrorista e privacidade são alguns dos eixos do debate.

No Reino Unido, o diretor do MI5 Andrew Parker propôs uma nova lei antiterrorista que concede mais poderes de vigilância eletrônica aos serviços secretos. Um importante editor e historiador conservador, Mark Hastings, não hesitou em acusar como corresponsáveis do que aconteceu o fundador do Wikileaks Julian Assange e o ex-agente da CIA Edward Snowden. Da Embaixada do Equador em Londres, onde está há dois anos e meio esperando uma autorização para deixar o país, Julian Assange falou à Carta Maior.

Qual é sua interpretação do massacre da Charlie Hebdo?

Como editor, foi um fato extremamente triste que aconteceu com uma publicação que representa a grande tradição francesa da caricatura. Mas agora temos que olhar adiante e pensar o que ocorreu e qual deve ser a reação. É preciso entender que a cada dia acontece um massacre dessa magnitude no Iraque e em outros países do mundo árabe. E isto aconteceu graças aos esforços desestabilizadores dos Estados Unidos, do Reino Unido e da França. A França participou do fornecimento de armas para a Síria, Líbia e da recolonização do Estado africano de Mali. Isto estimulou o ataque neste caso, usando um alvo fácil como a Charlie Hebdo. Mas a realidade é que o serviço secreto francês tem muitas perguntas para responder sobre o acontecido.

Acredita que houve um fracasso dos serviços secretos franceses?

É o que estão tentando esconder. Os serviços de segurança da França sabiam das atividades dos responsáveis pelo massacre e, no entanto, deixaram de vigiá-los. Por que os irmãos Kouachi, conhecidos por seus laços com extremistas, não estavam sob vigilância? Cherif Kouachi havia sido condenado por crimes terroristas. Longe de estar enviando mensagens criptografadas, eles se comunicaram centenas de vezes antes e durante os ataques com celulares comuns. Há muitas perguntas. Por exemplo, por que os escritórios da Charlie Hebdo não estavam mais protegidos dadas as duras críticas da revista ao Islã? Como os conhecidos jihadistas conseguiram armas semiautomáticas na França? Apresentaram os assassinos como supervilões para ocultar a própria incompetência dos serviços. A verdade é que os terroristas eram amadores bastante incompetentes que bateram o carro, deixaram suas cédulas de identidade à vista e coordenaram seus movimentos por telefone. Não era preciso uma vigilância massiva da internet para evitar este fato: era necessária uma vigilância específica.

Uma percepção bastante ampla é que você e o Wikileaks se opõem à vigilância eletrônica. Na verdade, você faz uma clara distinção entre vigilância massiva e vigilância com objetivos definidos.

A vigilância massiva é uma ameaça à democracia e à segurança da população, pois outorga um poder excessivo aos serviços secretos. O argumento para defendê-la é que assim se pode encontrar gente que não se conhecia de antemão. O que vemos, no caso de Paris, é que os protagonistas foram identificados. Deveria haver uma investigação profunda de como foram cometidos esses erros, apesar de minha experiência ser que isto não vá acontecer porque estes serviços são corruptos e são assim por serem secretos. A vigilância massiva não é gratuita e, neste sentido, é uma das causas do que aconteceu, porque restaram recursos e pessoal para o que teria de ter sido a vigilância específica contra uma ameaça terrorista.

Uma das reações mais virulentas na imprensa britânica foi a do historiador e jornalista Max Hastings que acusou você e Edward Snowden de responsabilidade nestes fatos. Hastings não está sozinho. Há muitas vozes que pedem que fechem ainda mais o certo sobre o Wikileaks. Percebe que o Wikileaks está ameaçado pela atual situação?

Há um ano que os setores vinculados a este modo de ver as coisas propõem um aumento da vigilância massiva e um corte das liberdades. Estão em retrocesso por todas as denúncias que houve sobre os excessos de espionagem cometidos pelos governos, inclusive com seus próprios aliados. O que estão tentando fazer é aproveitar esta situação para recuperar o território perdido. O Wikileaks publicou as caricaturas da Charlie Hebdo utilizadas como pretexto para o atentado, algo que não fizeram vários jornais como o Guardian ou o Times porque têm muito medo. Mas uma das coisas positivas que surgiram nos últimos dias é a defesa da liberdade de expressão. Digo isto apesar de, na manifestação de domingo, estarem presentes figuras que são os piores inimigos da liberdade de expressão, como Arábia Saudita e Turquia. Mas, por mais que estejam tentando aproveitar a situação, o Wikileaks funciona há bastante tempo e desenvolvemos técnicas para lidar com este tipo de ameaças. Não vão nos intimidar. Esperemos que outras mídias em nível mundial também não se deixem intimidar.

domingo, 30 de junho de 2013

O império em queda, o whistleblower em fuga

EUA ameaçam países que ajudarem Snowden

Fonte: ARede 

25/06/2013 - Em artigo publicado ontem no jornal La Jornada, David Brooks diz que "o homem mais procurado do mundo desapareceu como fumaça depois de voar de Hong Kong para Moscou, em um episódio em que vários países 'aliados' decidiram desobedecer às ordens de Washington e em que o grande aparato de espionagem estadunidense aparentemente não funcionou para evitar o que é, até o momento, a grande fuga de Edward Snowden.

De acordo com o jornal mexicano, além dos governos de Hong Kong, China, Russia e Equador, há indícios de que outros países poderiam se recusar a entregar Snowden - perseguido por revelar programas de espionagem de comunicações privadas de milhões de civis, dentro e fora dos Estados Unidos.

Em sua primeira referência ao assunto, diz o La Jornada, o presidente Barack Obama respondeu brevemente a perguntas durante uma reunião sobre a reforma migratória, afirmando que todos os canais legais estão sendo acionados e que os EUA estão trabalhando junto a vários países "para assegurar a aplicação da lei". De acordo com Brooks, o presidente estadunidense se referia a uma intensa pressão diplomática que tem sido frustrada a cada passo, e considerada por analistas e legisladores como "vergonhosa" e um revés para Obama.

A reportagem revela que o secretário de Estado John Kerry disse que Snowden é acusado de três atos graves de espionagem, e que a Rússia deveria entregá-lo aos EUA. Kerry mencionou possíveis "consequências" caso isso não aconteça. Sobre Hong Kong, o secretário afirmou que "seria profundamente preocupante se eles receberam notificaçáo adequada e decidiram ignorar, o que seria desrespeitar as normas".

Washington, conta o jornal mexicano, advertiu os países latinoamericanos que não permitam a passagem de Snowden. Fala-se que o aviso foi dirigido a Cuba, Venezuela e Equador. O chancelar do Equador, Ricardo Patiño, revelou que seu país está avaliando um pedido de asilo, o qual diz respeito a "liberdade de expressão e segurança de cidadãos ao redor do mundo". Patiño leu uma suposta declaração de Snowden, na qual comparava sua situação ao soldado Bradley Manning, que passou documentos secretos ao WikiLeaks e agora está diante de uma corte marcial acusado de "ajudar o inimigo".

Julian Assange, em uma teleconferência com veículos de comunicação, ontem, afirmou que Snowden "não é um traidor, não é um espião". É um "whistleblower" -- literalmente, alguém que sopra em um apito, referindo-se a pessoas que divulgam ao público informações sobre abusos ou violações de autoria de autoridades. O fundador do WikiLeaks confirmou que está dando apoio legal e financeiro a Snowden e que foi solicitado asilo a vários países, além do Equador. Funcionários da Islândia confirmaram que receberam o pedido formal, mas que o processo não pode ser iniciado sem que Snowden esteja no país.

Para o Equador, segundo analisa o La Jornada, oferecer refúgio a Snowden poderia gerar consequências econômicas, se Washington decidir modificar acordos comerciais com Quito. Na semana passada, Cuba e EUA negociavam o reinício do serviço postal direto e marcaram uma reunião sobre migração para meados de julho. Em relação à Venezuela, foi marcado um encontro entre o secretário de Estado Kerry e o chanceler Elías Jaua, para estudar o restabelecimento de representações diplomáticas e envio de embaixadores às respectivas capitais.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Que outra saída senão partilhar?

Opinião: quem se esqueceu do software livre?

Paulo Kliass
25/02/2013 

Fonte: ARede


As propostas de grupos como o Wikileaks e as ações mais recentes de Julian Assange, a partir do asilo concedido na Embaixada do Equador em Londres, recolocam no centro do debate político internacional questões essenciais que relacionam economia, poder e informática, nestes tempos de mudanças profundas nos padrões tecnológicos e culturais da sociedade contemporânea. A era da emergência das chamadas tecnologias da informação e comunicação (TICs).

No Brasil, o movimento pela democratização das condições de “ciência, tecnologia e inovação” encontra um espaço importante no movimento para disseminação do software livre. Afinal, convenhamos que é mesmo um absurdo ficarmos, todos nós, reféns das vontades e dos interesses de um punhado de poderosas mega-empresas da tecnologia virtual. É o caso da Microsoft e similares, que ganham fortunas apenas com os direitos autorais e de propriedade de seus programas, os chamados produtos software e aplicativos. Isso sem contar o enorme faturamento obtido também com a produção de máquinas e equipamentos, os produtos hardware. Usam e abusam de sua imensa influência para impedir o surgimento de outros caminhos. Escondem a 7 chaves os segredos de sua linguagem e de seus códigos, as fontes de seu poder no mercado e na sociedade.

Independência frente aos grandes grupos
Em razão desse tipo de constrangimento, é crescente o movimento de constituição de alternativas que não dependam desse tipo de amarração jurídica e financeira aos grandes grupos. Por todos os continentes são constituídos, a todo momento, grupos formais e comunidades informais de pesquisadores, profissionais e demais interessados, cujo objetivo é criar e oferecer, para toda a sociedade, o livre acesso aos mesmos tipos de programas de informática sem a necessidade de remunerar monetariamente direitos autorais ou de propriedade. São os chamados “free software”. Pra além do não pagamento, a idéia de “free” deve ser associada à liberdade para os usuários dominarem e abrirem a “caixa preta” dos sistemas. Com isso, os mesmos poderiam ser aperfeiçoados e reproduzidos de forma generalizada. O objetivo maior sendo a democratização do acesso e do uso dos programas.

No entanto, para que essa alternativa se viabilize e seja aceita de forma ampla, dentre os inúmeros universos de usuários existentes, é essencial que tais iniciativas contem com o apoio do Estado, por meio da formulação e implementação de políticas públicas para o setor. Afinal, as medidas estratégicas visando a universalização da inclusão digital deveriam incorporar a noção implícita de que o direito ao acesso ao mundo virtual é condição fundamental do exercício pleno da cidadania.

Apoio do Estado e políticas públicas
O apoio da Administração Pública pode vir sob diversas formas. A primeira delas é por meio de políticas de incentivo e financiamento ao desenvolvimento de software livre, tanto nas universidades e nos centros de pesquisa, quanto nos grupos informais e comunidades de ativistas. Com isso, contribuindo para criar massa crítica e para tornar permanente a formação de profissionais com esse perfil. Em segundo lugar, o Estado pode atuar de forma mais incisiva ao estabelecer que suas necessidades e solicitações de produtos e serviços de informática sejam direcionadas para o software livre. Com isso, ficaria assegurada uma demanda significativa para esse tipo de alternativa de programas e os orçamentos da União, dos estados e dos municípios deixariam de ser onerados pelos encargos com pagamento de direitos às grandes empresas de TICs. Em terceiro lugar, o Estado deve constituir fundos de financiamento específicos para o desenvolvimento desse tipo de programa, com o objetivo de disseminar sua utilização e oferecer condições de pesquisa e empreendedorismo para todos que desejem atuar com esse tipo de projeto. Finalmente, cabe aos órgãos governamentais exercer de forma mais incisiva seu papel de regulamentador e fiscalizador das condições de concorrência no mercado, para evitar as conhecidas práticas sob a forma de cartel ou abuso de poder econômico.

Ascensão e queda no governo Lula
Como se pode perceber a tarefa é árdua e as oportunidades políticas não podem ser desperdiçadas. Assim, o processo da vitória de Lula nas eleições presidenciais e o início de seu mandato em 2003 foram vistos pelas entidades, grupos e indivíduos que atuavam na área como o grande momento para colocar o processo em marcha e transformar o sonho em realidade. O lema generalizado era: “Sim, é possível!”. Durante os primeiros anos de governo houve até mesmo um esboço de incentivo à ampliação do uso do software livre e de sua propagação como política pública federal. Diversos grupos de trabalho foram constituídos para implementação de medidas em áreas como: i) inclusão e acesso digitais; ii) aprofundamento da estratégia do governo eletrônico; e iii) universalização da produção e acesso ao software livre, dentro e fora dos órgãos governamentais.

Porém, a força das empresas do setor não esperou muito para se manifestar. E, pouco a pouco, os poderosos das TICs foram reconquistando o terreno, articulando junto a políticos influentes no Executivo e reforçando seu “lobby” junto ao Legislativo. O objetivo central era minar, ainda no nascedouro, essa chamada “aventura irresponsável” do software livre. Apesar de perder força no interior do governo, a iniciativa ainda se mantinha acesa na esfera de poder da Presidência da República. Tanto que o próprio Lula assinou, em 2005, a apresentação de uma importante diretiva para que o software livre fosse adotado como regra para o uso das políticas de informática no interior da Administração Pública.

O documento “Guia Livre: Referência de Migração para Software Livre do Governo Federal” estabelece uma estratégia para completar um processo que teve início logo no início do governo: romper a dependência tecnológica e financeira em relação aos grandes grupos. O texto assinado pelo Presidente não poderia ser mais claro a respeito de um engajamento com tal opção de política pública:

“Nos últimos três anos, implementamos uma forte política de independência tecnológica, de fortalecimento da pesquisa em computação de alto desempenho, de inclusão digital e de adoção do software livre. Elementos que compõem uma política industrial e uma estratégia de desenvolvimento nacional para esse setor.”

O texto de Lula refletia, com toda a certeza, o pensamento e a vontade da maioria dos integrantes de sua equipe de governo a respeito do assunto até o ano de 2005. O software livre era encarado como política pública e merecia o tratamento de prioridade. Vejamos outro trecho carregado de recados e significados:

“Quero agradecer a todos os que defendem o software livre e lutam pelo aprofundamento e ampliação dos direitos de cidadania em todo o mundo. As potencialidades e os desafios das novas tecnologias da informação têm cada vez mais importância para o efetivo exercício desses direitos. Em nosso ponto de vista, o acesso a esses avanços tecnológicos deve ser direito de todos e não privilégio de poucos. Por isso, o governo federal tem intensificado o diálogo democrático com a sociedade e tratado o software livre e a inclusão digital como política pública prioritária. Entre os resultados desse diálogo estão programas importantes em curso no País.” (grifo nosso)

Apesar dessa diretriz inequívoca, a questão do software livre foi, pouco a pouco, perdendo espaço na pauta de governo. O jogo de pressão das grandes empresas terminou por vencer a disputa, pois os dirigentes políticos não tiveram a coragem necessária para levar à frente esse importante projeto. O roteiro foi muito semelhante ao do que ocorreu com a submissão aos interesses dos banqueiros e do financismo, aos interesses das empreiteiras e das construtoras, aos interesses dos representantes do agronegócio e do latifúndio, aos interesses das empresas de telecomunicações e aos interesses dos grandes meios de comunicação. Neste caso, em particular, o governo terminou cedendo aos interesses dos grandes grupos de TICs. Tudo em nome da suposta necessidade de governabilidade. Tudo plenamente justificado pela busca de um modelo de realismo e pragmatismo políticos, que sempre termina por distorcer o sentido primeiro da conquista do poder: a transformação social.

Urgência em retomar o tema e o potencial do Brasil
O Brasil tem uma história recente que confirma seu potencial para alavancar um setor de computação competente e eficaz. Isso vem desde a antiga política nacional de informática, quando se pretendia desenvolver um setor nacional, com incentivos fiscais e estímulo governamental. Apesar dos problemas apresentados por tal estratégia, o fato é que o ingresso nos anos 1990, a adoção do receituário neoliberal e o mito da globalização acabaram por inviabilizar tal opção. Quando Collor escancarou de forma generosa e irresponsável o mercado brasileiro à concorrência internacional, não havia meios de resistir.

E, apesar da enorme pressão contra tudo o que fosse público, mesmo no interior da administração do Estado sempre houve ilhas excelência para desenvolvimento de programas e processos na área de informática. Era o exemplo do CPQD na Telebrás, antes de sua privatização. Ou então o caso do SERPRO, ainda operando para o governo federal no âmbito do Ministério da Fazenda. Isso significa que, caso o setor público venha a confirmar sua demanda por esse tipo de serviço, a sociedade brasileira pode criar as condições para sua implementação. O que falta, porém, é uma garantia de continuidade na política pública e o estímulo para que as novas gerações de profissionais e usuários sejam educadas e formadas em ambiente favorável ao uso do software livre.

Para além da questão da economia de recursos do orçamento - aspecto que não deve ser negligenciado de forma nenhuma, a política pública de software livre carrega consigo a noção de inclusão digital, de política industrial e de estratégia de desenvolvimento nacional. O desenvolvimento de capacitação econômica e profissional no setor de TICs internamente é essencial para um projeto de País. Um território de dimensões continentais como nosso, uma sociedade complexa como a brasileira, uma população tão numerosa como a que atingimos e uma estrutura econômica tão diversa e dispersa como a que temos não podem prescindir de uma política de tecnologia de comunicação e informação também autônoma, e que seja adaptada e voltada para os nossos problemas e desafios.

O monitoramento da Amazônia verde, o acompanhamento da Amazônia azul (o Oceano Atlântico de 200 milhas por quase 8.000 km de costas), os desdobramentos do Pré-Sal, o monitoramento das situações de riscos, os mecanismos de defesa de nossas fronteiras e tantos outros itens vitais não podem ser deixados para tratamento pelas grandes empresas do setor. Na verdade, trata-se de afirmar um desejo e uma necessidade de independência tecnológica e de soberania nacional. A política de software livre é tão somente a ponta do iceberg de um conjunto mais amplo de medidas para que o Brasil tenha condições de enfrentar de forma competente e robusta os desafios desse mundo cada vez mais multipolar.

A institucionalidade da Presidência da República ainda manteve a estrutura responsável por esse tipo de ação, o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação. O governo possui até mesmo um Plano Plurianual para o setor. Mas o quadro atual é muito distante daquele descrito por Lula há 7 anos atrás. Uma das evidências mais carregadas de simbolismo é que a página específica da internet parece que parou no tempo. É necessário que o governo se dê conta da importância do tema e recupere o espaço perdido, recolocando o software livre como prioridade em sua agenda. Para tanto, é essencial que lembremos, a todo instante, à equipe de Dilma Rousseff sobre a natureza estratégica dessa política pública: não se esqueçam jamais do software livre!

Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.


complemento imperdível: entrevista recente de Assange "concedida na embaixada do Equador no Reino Unido, Julian Assange fala sobre seu novo livro, que está sendo publicado no Brasil, e analisa o atual momento da mídia mundial. 'O abuso que grandes corporações midiáticas fazem de seu poder de mercado é um problema. Nos meios de comunicação, a transparência, a responsabilidade informativa e a diversidade são cruciais. Uma das maneiras de lidar com isso é abrir o jogo para que haja um incremento massivo de meios de comunicação no mercado', defende.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

"Liberdade de expressão": argumento para gregos e troianos...?

Wikileaks e o paradoxo da liberdade de expressão

Fonte: Bia Martins, do Autoria em Rede

Mais uma vez, vou fugir um pouco do tema do blog para falar de outros aspectos da comunicação digital que estão desestabilizando o modo tradicional de circulação da informação. Estou me referindo especificamente ao Wikileaks, para quem ainda não sabe, uma organização internacional que divulga dados confidenciais, vazados de governos ou empresas, sobre temas sensíveis. Entre eles, um vídeo de 2007 que mostra o ataque de um helicóptero do exército norte-americano em Bagdá, que matou pelo menos 12 pessoas, entre elas dois jornalistas da agência de notícias Reuters; além de documentos secretos que confirmam a morte de milhares de civis no guerra do Afeganistão em decorrência da ação militar dos EUA.

Mais informações sobre o tema na Wikipédia

Ou direto no site do Wikileaks

Atualmente Julian Assange, seu fundador e um dos atuais coordenadores, está refugiado na embaixada do Equador em Londres. Ele responde a acusações de estupro e abuso sexual na Suécia, as quais nega, e corre o risco de ser extraditado para os Estados Unidos, onde pode ser processado por espionagem e fraude. Há especulações de que ele possa ser condenado à morte, já que um de seus principais informantes, o militar americano Bradley Manning, está preso em confinamento solitário há dois anos e meio na base naval de Quantico, sem direito sequer a julgamento.

Paulo Moreira Leite faz uma boa avaliação do caso aqui

Aí então é que surgem as perguntas: por que divulgar informações que são de interesse público é crime? Por que Assange foi transformado no inimigo público número um dos EUA? Além disso, por que organizações financeiras como Bank of America, VISA, MasterCard e PayPal bloquearam as doações ao Wikileaks? A liberdade de expressão não é um valor defendido com unhas e dentes pelos governos dos EUA e Inglaterra? O que mudou, afinal?

Antes da Internet, o modelo de produção e distribuição de notícias era bastante centralizado: poucas empresas jornalísticas tinham o monopólio sobre os dados aos quais a sociedade teria acesso. Mas, já há algum tempo, essa situação mudou, pois os produtores e disseminadores da informação se multiplicaram. Embora os meios de comunicação de massa, como televisão, jornal impresso e rádio, tenham ainda maior poder de penetração, sites e blogs constroem um contraponto à narrativa dominante, facilitando a circulação de posições políticas diversas e dificultando a constituição de um discurso único.

O Wikileaks trouxe um elemento a mais: a possibilidade de forçar a transparência de dados estratégicos, tanto do governo como de empresas. Para isso, conta com a ajuda de informantes anônimos, que repassam as informações de dentro dessas organizações. O meio digital facilita a operação, não só porque torna mais vulnerável o bloqueio ao acesso de dados, mas também porque permite sua rápida e ampla difusão. Um bom hacker pode fazer tudo isso sem deixar rastros…
Talvez o título deste post esteja incorreto. De fato, o paradoxo não é da liberdade de expressão, mas sim da forma pela qual essa bandeira tem sido levantada por governos ditos democráticos: dependendo dos interesses em jogo, do que se quer mostrar ou esconder, essa liberdade é incentivada ou criminalizada. Hoje, através das redes, não há mais como deter o livre fluxo da informação, doa a quem doer. O interesse público agradece.