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sábado, 25 de julho de 2015

Livros de colorir: que história contam?


Cultura, mercado editorial
Haroldo Ceravolo Sereza 
sexta-feira, 29 de maio de 2015 

 

O que explica o sucesso dos livros de colorir?

Há um certo furor em torno dos livros de colorir, best sellers nas livrarias. Há muito frisson, temor, comemoração de editores que embarcaram a tempo na onda.

O que explica esse fenômeno? Como ele surgiu? Do que se alimenta?

Primeiro, não acho que seja um problema que adultos estejam usando lápis de cor. Desenhar e pintar são atividades lúdicas, e os adultos têm também o direito à diversão. Segundo, do ponto de vista intelectual, qual a diferença entre pintar em jogar baralho? Ou ver novela? Não há rebaixamento nenhum nessas atividades, e só o preconceito é que explica que se vire a cara para uma tendência dessa.

Não vejo nenhum processo de infantilização, a menos que alguém me prove que pintar é uma atividade controlada diretamente pelo sistema hormonal, ou seja, que “biologicamente” ficamos despreparados para usar o lápis depois que passamos a puberdade. Se alguém estiver a fim, aguardo o link de um revista científica.

Mas vamos pensar nas origens. Como surgiu o livro de pintar?
lápis de cor
Lápis de cor da marca Caran d’Ache: uma indústria que realmente lucra com os livros

Ainda que não tenha feito nenhuma reportagem ou estudo específico sobre o tema, eu arriscaria a descrever o processo, baseado no relativo conhecimento de como funcionam as pesquisas e as corporações.

Minha primeira hipótese: o livro de colorir para adultos surgiu fora da indústria editorial. Ele tende a ser o resultado de alguma percepção genial de outra indústria, a de lápis de cor.

Novamente sem ter frequentado nenhum dado concreto, eu enumeraria os passos do nascimento do fenômeno:

1. A indústria de lápis de cor alcança uma sofisticação técnica que permite, a preços razoáveis, produzir diferentes tipos de lápis, em processos tão variados e sofisticados quanto o que já existia para os lápis grafites simples (em geral usamos o lápis preto número 2, mas há inúmeras outras possibilidades para quem desenha, com pontas mais macias, mais duras, mas grossas, mas finas – lembra das lapiseiras?).

2. A indústria do lápis de cor esbarra num mercado limitado: mães e pais não vão torrar o rico dinheirinho da família em produtos de ponta, uma vez que as crianças perdem os lápis com a mesma facilidade que esquecem os agasalhos nas escolas.

3. A indústria do lápis de cor encomenda uma pesquisa.

livro de colorir
Imagem do blog “Mesinha de Cabeceira“: livros coloridos também vão parar na Internet

E o que diz essa pesquisa? Diz que já há um grupo de pessoas que usa a pintura com lápis de cor para se distrair, para desligar o celular, para não assistir novela, para não ter de aprender a tricotar. Diz ainda que essas pessoas se irritam com a baixa qualidade dos lápis que são vendidos às crianças e principalmente com a baixa variedade de cadernos de pintura.

“Pintar o Pato Donald, da revista de R$ 1,99 vendida na banca de jornal, é absolutamente irritante”, afirma um dos entrevistados numa suposta pesquisa qualitativa. A pesquisa qualitativa ocorreu depois de uma pesquisa quantitativa com os adultos que compravam lápis de cor nas lojas especializadas. Esses entrevistados anteriormente já haviam afirmado, em sua maioria, que os lápis de colorir novos têm preços razoáveis, mas que é um tormento achar desenhos bacanas para pintar.

A pesquisa custou uma fortuna e identificou um gargalo: faltam imagens, papel e formatos adequados para expandirmos o nosso mercado. Mas qual a solução?

Achar alguém que produza imagens, papel e formatos adequados para que os pintores a lápis de cor tenham com que se divertir. Vem o segundo momento.

Numa reunião de uma grande empresa do setor, talvez até mesmo na associação dos produtores de lápis de cor, alguém propõe o seguinte encaminhamento:

1. Vamos procurar uma grande editora e propor uma edição de livros de colorir em quantidade suficiente para podermos acompanhar o processo com novas pesquisas.

2. Se essa editora não se convencer com os nossos dados, vamos financiar uma edição piloto.

Resultado:

1. A editora estuda o caso e pensa em algo especial: o livro de colorir não deve ser uma simples reprodução luxuosa da revista de colorir da banca de jornal. Tamanho da página, espessura, cor e textura do papel, orelha para marcar a última página pintada… Tudo isso tem de ser pensado para o máximo de conforto do pintor.

2. A indústria do lápis de cor gosta da proposta. E resolve pagar também um plano de marketing para essa editora-modelo, de modo que ela, além de espaço nas livrarias para seus livros, também leve alguns de seus novos produtos para lá.

Começa, então, uma nova fase.

1. O caso é testado num mercado local, numa cidade como Curitiba (PR). Como se sabe, Curitiba foi, por muitos anos, a cidade-teste de lançamento de novos produtos no país.

2. O case é um sucesso nessa hipotética Curitiba, e a indústria do lápis de cor e sua editora associada resolvem lançar o produto em escala nacional.

3. O sucesso se repete. Outras editoras percebem o sucesso e resolvem copiar o modelo, agora sem apoio da indústria do lápis de cor.

4. Chegamos à escala planetária, que inclui o Brasil. No Brasil, o sucesso é maior ainda – os livros, já fui conferir, são quase todos reproduzidos de editoras estrangeiras. Não diria traduzidos porque, afinal…

E por que isso não é um problema para as editoras de livros que não de colorir?


Livro Fantasia Celta, no blog Mais uma página

Ora, não é um problema porque o livro de colorir, por mais que venda, não está concorrendo diretamente com o livro de ler. O livro de colorir é um problema para o Google, para o Facebook, para o UOL, até para o Opera Mundi. Ele concorre com o mundo da imagem na internet. Ele concorre contra a ultraconexão.

A médio prazo, diria, ele até é um aliado da leitura, especialmente da leitura em livros de papel: porque ele tende a criar um espaço temporal de distância dos eletrônicos, do videogame (sim, adultos também já jogam videogame há algumas décadas), das redes sociais.

Colorir é um ato de introspecção. De relaxamento. De pensar imageticamente.

Colorir é atuar. Cria uma relação ativa entre o pintor amador e o livro. Há uma interação permanente, uma ligação quase afetiva.

Como disse, tudo isso é especulação.

Se não é verdade, pode virar um romance. Ou uma graphic novel.

segunda-feira, 11 de março de 2013

MEU PRIMEIRO E-BOOK

por Samantha Maia
Fonte: Carta Capital



Há pouco mais de um ano, 70% dos brasileiros nunca tinham ouvido falar em livros digitais. A experiência com essa leitura, em geral de obras disponibilizadas em PDF gratuitamente na internet, era considerada uma opção de segunda linha, incapaz de superar o papel. O mercado digital muda, porém, de maneira veloz. A aposta recente das grandes empresas vendedoras de e-books no Brasil – Amazon, Apple e Google – e a movimentação das maiores redes de livrarias brasileiras – Livraria Cultura e Saraiva – para não ficarem atrás no negócio marcam a entrada de vez do novo produto no País. “É um caminho sem volta”, diz Hubert Alqueres, da Câmara Brasileira do Livro (CBL), representante das editoras.


A Apple iniciou as vendas de e-books brasileiros em outubro de 2012, por meio da iTunes. Em dezembro foi a vez do Google, com o Google play, e da Amazon, com seu site brasileiro. Alex Szapiro, vice-presidente do Kindle da Amazon do Brasil, conta que a empresa estudou o mercado durante um ano e meio. “Viemos pelo potencial brasileiro de ser um dos maiores mercados do mundo.” A Livraria Cultura e a Saraiva já comercializavam livros digitais desde 2010, mas o volume de obras disponíveis equivalia a 10% do que existe hoje.


O acervo continua pequeno comparado a mercados maduros. São 15 mil títulos em português, diante de 1 milhão de obras nos Estados Unidos, onde as vendas de e-books começaram nos primórdio dos anos 2000. No mercado de livro impresso, 58 mil títulos foram lançados apenas em 2011. Os investimentos das editoras para a conversão dos arquivos devem, no entanto, impulsionar rapidamente o número de obras brasileiras disponíveis em formato digital.


Uma novidade importante foi o governo federal publicar, há duas semanas, um edital para a compra de 80 milhões de livros digitais didáticos, com entrega prevista a partir de 2015. A iniciativa casa com a aquisição recente de 600 mil tablets para professores. Pelo fato de 30% do faturamento do setor editorial brasileiro vir de encomendas governamentais, a primeira compra pública de e-books é um passo decisivo para organizar esse mercado e derrubar o custo de produção.


A difusão dos tablets e dos smartphones no Brasil foi importante para aumentar a atratividade dos e-books com o ganho da mobilidade. Em 2012, cerca de 3 milhões de tablets foram vendidos no País. O livro eletrônico tem, porém, um instrumento próprio que ainda não é comum entre os brasileiros: o e-reader, ou leitor digital. São aparelhos leves, com menos de 200 gramas, dimensão em média de 6 polegadas e tela sem brilho, que cansa menos a vista. Custam de 300 a 400 reais, têm memória para armazenar mais de mil livros e bateria que dura até 30 dias. É em torno de tais dispositivos que está centrada a disputa no mercado local. Mais do que nos preços, hoje em média 30% mais baixos que os livros convencionais, e no acervo, ainda com pouca diferença -entre os concorrentes.


Há cinco anos, a americana Amazon lançou o Kindle, por meio do qual é possível comprar, baixar e ler os livros digitais adquiridos em seu site. A multinacional trabalha com um formato de arquivo de e-books próprio, o KF8, diferente do resto do mercado, que usa o Epub. Com a aproximação da Amazon do território brasileiro, as demais varejistas ligaram um sinal de alerta, e a Livraria Cultura correu para divulgar a parceria com a Kobo, fabricante japonesa de e-readers. A venda de dois tipos de dispositivos nas lojas da Cultura foi iniciada na quarta-feira 23. Todo o cuidado é tomado porque quem comprar um Kindle não vai consumir livros da Livraria Cultura e da Saraiva, por exemplo, pois o dispositivo não lê o formato Epub. Os dois formatos podem, no entanto, ser abertos em computadores, tablets e smartphones, via programas ou aplicativos próprios.


“Não olhamos o nosso modelo de negócio como aberto ou fechado. Você compra um título na Amazon e pode lê-lo em múltiplas plataformas: no PC, no Mac, no iPhone, no iPad, no Android. É só baixar os nossos aplicativos Kindle”, defende Szapiro. Arquivos em PDF também podem ser lidos no dispositivo da Amazon.
Onde o e-reader caiu no gosto dos consumidores, registra-se, a Amazon abocanhou fatias consideráveis das vendas com o seu Kindle. Na dúvida sobre o melhor aparelho, e a considerar a limitação das diferenças de formatos, clientes se perguntam a que -conteúdo poderão ter acesso a partir de cada um. Apesar de as empresas afirmarem que a busca por títulos exclusivos deve ser estratégica, seus catálogos, por enquanto, oferecem em grande parte best sellers e obras tradicionais.


A parceria com o Kobo trouxe um catálogo de 1 milhão de títulos para a Cultura, mas apenas 15 mil nacionais. A expectativa de Sergio Herz, presidente-executivo da empresa, é de que as vendas de e-books dobrem em 2013 e impulsione os lançamentos das editoras. “É um mercado em transição, estamos aprendendo ainda com ele. Consideramos o catálogo atual bom e está crescendo.” A Amazon tem 13 mil livros nacionais e a Saraiva, 15 mil. “Conseguimos acrescentar 350 títulos ao nosso catálogo apenas em janeiro”, diz Marcilio Pousada, diretor-presidente da Saraiva.


As livrarias menores, perto de 3,5 mil no País, são desafiadas a adaptar-se ao novo cenário, mas ainda não encontraram uma maneira de competir com as grandes redes. Uma estratégia deve ser definida até o fim do ano. A Associação Nacional das Livrarias (ANL) chegou a apresentar um pedido ao governo de proteção ao setor. A carta aberta traz sugestões como o estabelecimento de um intervalo de 120 dias entre o lançamento de livros impressos e os digitais, o desconto máximo de 30% do e-book sobre o preço do impresso, no caso das livrarias, ou de 5% no caso de venda direta da editora ou distribuidora. “Somos importantes para manter a bibliodiversidade, um papel que tem de ser mantido no mercado digital”, diz Ednilson Xavier, presidente da ANL.


Os escritores, por sua vez, esperam conseguir vender mais e obter maior participação nas vendas. No livro impresso, os contratos garantem de 10% a 12% do preço de capa para o autor, e no caso de e-books, o repasse tem sido de 40% a 45%. “Esperamos conseguir uma participação de 70% a 80%, pois os livros digitais são mais baratos para as editoras”, diz Joaquim Maria Botelho, presidente da União Brasileira dos Escritores (UBE). Segundo as editoras, não existe regra para esse porcentual. “A queda de custos pode, sim, beneficiar os escritores, mas isso depende de cada contrato”, diz Alqueres, da CBL

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Regular a tv paga importa? - reflexões sobre meios e materiais de produção e difusão dos textos

Intervozes defende nova Lei de TV paga no STF


18/02/2013 - Veja, na íntegra, o texto enviado pelo Coletivo Intervozes ao STF.

"AUDIÊNCIA DO STF sobre a Lei 12.485/2011

Prezados senhores, prezadas senhoras. Gostaríamos de agradecer a oportunidade de apresentar aqui nosso ponto de vista sobre essas ADIs contrárias a uma lei que para nós é vital para ampliar a diversidade do sistema comunicacional brasileiro. A apresentação que faremos tem por objetivo analisar como se organiza esse mercado, por que ele tem uma tendência a concentração maior que os outros e como as medidas propostas na lei dificultam a concentração e, assim, efetivam a livre iniciativa e aumentam a liberdade de escolha do usuário consumidor.

O mercado de comunicação tende à concentração.

O mercado de comunicação não se comporta da mesma forma que mercados de bens materiais como cadeiras ou aparelhos eletrônicos. A comunicação lida essencialmente com informação, que é um bem intangível e não rivalizável, o que significa que o consumo de uns não priva os outros de também consumir.

Neste caso não há escassez natural, e o mecanismo de preços não é suficiente para governar o mercado. Deste modo, para se gerar valor de troca para a informação é preciso se criar mecanismos de escassez artificial. A TV por assinatura faz isso por meio do controle de acesso.

Os desafios para atingir pluralidade e diversidade começam da própria estrutura do mercado.

Nesse mercado os custos majoritários são os custos fixos para produzir a primeira unidade, com o custo marginal tendendo a zero, ou seja: custa praticamente a mesma coisa para produzir e distribuir um programa de TV para uma pessoa, quanto custa para distribuí-lo para milhões de pessoas. Isso quer dizer que não há como diluir o custo se ele não atingir um grande público. Estamos falando, portanto, de uma economia de escala.

Outro fator consiste no fato de que dois ou mais produtos de comunicação podem ser produzidos de forma mais barata se feitos em conjunto pelo mesmo fornecedor, do que separadamente por fornecedores competindo entre si.

Esses dois fatores favorecem o surgimento de um mercado concentrado, criando barreiras de entrada praticamente intransponíveis e o abuso do poder de mercado por empresas dominantes ao custo dos consumidores. Por isso, mecanismos ex-ante (regulação preventiva) são reconhecidamente necessários em mercados em que há um gargalo intransponível para se completar a cadeia de valor. É assim que boa parte dos países capitalistas garante condições de competição neste mercado.

A produção condicionada pela audiência torna o conteúdo homogêneo.

Por outro lado, é preciso salientar que a audiência não é o resultado da livre distribuição das preferências do consumidor. A audiência é sujeita a lei de Hotelling, que afirma que em mercados onde a competição não é guiada por preço, competidores economicamente racionais tenderão a se concentrar na metade do espectro de gostos do consumidor, em vez de prover uma gama diversa de produtos. Portanto o controle remoto nas mãos do consumidor não basta como instrumento para garantir que suas preferencias estejam efetivamente representadas na oferta dos conteúdos. No caso da TV a cabo, isso se acentua por se tratar de um mercado internacionalizado, onde o produto estrangeiro – muitas vezes de ótima qualidade – chega aqui já amortizado, podendo ser oferecido a custo bastante baixo. Para piorar, quando as mesmas empresas atuam em várias etapas da cadeia de valor, elas buscam criar gargalos para excluir seus concorrentes.

Deste modo, se a competição sozinha não traz diversidade, políticas públicas de comunicação são fundamentais para isso. Uma abordagem regulatória para propriedade baseada em competição e em considerações comerciais não é adequada para proteger a diversidade e a democracia. Os quase 20 anos de TV a cabo no Brasil evidenciaram este limite. Medidas positivas são necessárias para garantir diversidade interna e para prover acesso desobstruído, para pessoas e organizações, aos recursos comunicacionais da sociedade. A afirmação de que as cotas de programação ferem a liberdade de expressão é equivocada, pois inverte o argumento. A garantia da diversidade e pluralidade de conteúdos reforça a liberdade de expressão permitindo a circulação de falas que estavam silenciadas pela estrutura de concentração. Prova disto é a grande quantidade de conteúdos nacionais que já eram produzidos há muito tempo, tinham espaço no mercado internacional e que só agora encontraram janelas de exibição no Brasil, sendo bem aceitos pelo público.

O mercado de comunicação brasileiro é fechado nacional e internacionalmente.

A Lei 12.485 não restringe a participação do capital estrangeiro no mercado brasileiro, pelo contrário, ela inclusive permitiu a entrada no mercado de empresas de telecomunicações estrangeiras que antes estavam impedidas de atuar na distribuição.

Antes da Lei, tanto o consumidor quanto a livre iniciativa estavam prejudicados pelas desleais condições de concorrência estabelecidas. Isso é facilmente percebido ao se analisar os números que organizam o mercado.

Segundo a Ancine, todo o mercado audiovisual brasileiro faturou em 2010 cerca de US$ 15 bilhões. Note que essa cifra não corresponde apenas à TV por assinatura, mas também soma o faturamento da TV aberta, salas de cinema e vídeos domésticos. Do outro lado, estão empresas estrangeiras que chegam a faturar sozinhas US$ 40 bilhões por ano, quase 3 vezes mais que todo o mercado nacional. Ao menos 4 empresas estrangeiras que atuam no mercado nacional faturam mais sozinhas do que todo o mercado audiovisual brasileiro.

A lei abre espaço para a produção nacional em um cenário de desiguais condições, pois as barreiras à entrada na atividade de programação são gigantescas. Exemplo disso são as várias produtoras nacionais que conseguem vender sua programação no exterior, mas que não conseguem circular seu conteúdo no mercado brasileiro. Deste modo, a lei 12.485 não protege atores fracos ou produções ruins, ela apenas atende a uma demanda que não encontra espaço nas condições de extrema desigualdade.

Por isso, é importante que haja regulação nesse mercado, para haver mais concorrência, inclusive entre canais estrangeiros, de diferentes lugares e países. Repare que dos 80 canais estrangeiros de espaço qualificado no mercado brasileiro, 78 são de empresas controladoras dos Estados Unidos e apenas 2 são de empresas europeias (BBC HD e Eurochannel). Ou seja 97,5% dos canais estrangeiros são de um único país. Estamos bem distantes da multiplicidade de canais existente no exterior.
Esse mercado precisa ter mecanismos de regulação ex-ante porque tem barreiras à entrada intransponíveis que fazem o consumidor necessariamente perder em diversidade e liberdade de escolha e a livre iniciativa perder em condições de concorrencia. Ao estabelecer limites para a verticalização e para a propriedade cruzada e um mecanismo de cotas, o que o legislador fez foi estabelecer uma dinâmica de organização do mercado que permita condições mais equilibradas de competição, fazendo com que a livre iniciativa não seja 'letra morta', mas um conceito vivo e passível de ser efetivado.

A lei também estabelece mecanismos ex-poste onde eles são mais adequados e suficientes, mas ainda assim esse mecanismo não é aceito pelas empresas.

As programadoras estrangeiras, por exemplo, entraram com uma medida cautelar para se credenciarem na Ancine sem apresentação de seus contratos com as empacotadoras. Isso sugere que elas estão abusando de seu poder de mercado e impondo barreiras aos novos canais.

Verticalização do mercado aumenta a concentração.

A base do tratamento que a lei dá à questão da propriedade é separar distribuição e programação. Ou seja, quem tem a infraestrutura de distribuição não pode controlar a programação de conteúdo, e vice-versa. Esta é a chave encontrada por vários países, em especial na União Europeia, para dificultar a concentração neste mercado com enormes barreiras à entrada. Nesse sentido, é preciso olhar o mercado audiovisual como um todo, e por isso o artigo quinto da Lei 12.485 restringe inclusive a propriedade cruzada entre meios de radiodifusão e distribuidores de TV por assinatura.
Entretanto as maiores restrições estão colocadas para a propriedade vertical, incidindo sobre a cadeia produtiva da própria TV por assinatura. O mercado brasileiro tem características de grande verticalização, com poucos grupos econômicos que oferecem praticamente toda a cadeia ao consumidor, restringindo suas opções. Assim, como falamos anteriormente, essas restrições atuam ao mesmo tempo em benefício do consumidor aumentando sua possibilidade de escolha e da livre iniciativa aumentando a competitividade do mercado.

Desverticalizar para aumentar a liberdade de escolha.

É importante mencionar que a lei não proíbe totalmente a propriedade vertical, mas estabelece tetos de participação a fim de evitar os efeitos negativos da verticalização. Além disso, a lei estabelece mecanismos criativos de incentivo à diversidade, por meio da promoção da cultura nacional e do estímulo à produção independente, previstos expressamente no inciso II do artigo 221 da Constituição Federal.

Ao definir que uma produtora independente não pode ser controladora, controlada ou coligada a uma programadora, empacotadora ou distribuidora, a lei cria uma estrutura mais democrática permitindo que novas empresas entrem no mercado e que o consumidor tenha mais opções de escolha.
Em todo o mundo, as legislações que atuam ex-ante no controle da propriedade vertical são até mais rigorosas e eficientes que a elaborada no Brasil. Aqui, por exemplo, o empacotamento e distribuição podem e são feitos praticamente pelas mesmas empresas. Nesse contexto, o consumidor brasileiro é obrigado a escolher o pacote de canais em função da tecnologia de distribuição disponível para o seu domicílio, já que por aqui as empresas operadoras se ocupam justamente das duas atividades estabelecidas na Lei. Em localidades onde não exista, por exemplo, infraestrutura de fibra ótica, o consumidor não tem opção de contratar determinada empresa de empacotamento atrelada a essa tecnologia.

Na França a separação total entre serviços de infra estrutura e serviços de conteúdo permite que o consumidor, ao optar pelo pacote de canais de uma empresa, possa também escolher por qual via quer receber esse pacote, se por fibra ótica, satélite, cabo telefônico ou outro meio disponível, pois a distribuição está totalmente desvinculada do empacotamento. Isso uma vez mais aumenta a oferta para o consumidor porque aumenta a quantidade e diversidade de atores nesse mercado.
Em resumo, a Lei 12.485/2011 foi feita com o objetivo de tornar o mercado audiovisual brasileiro mais democrático e tem conseguido realizar esse objetivos já nos primeiros meses de aplicação da lei. Nesse ambiente, a produção nacional se torna mais robusta e os conteúdos a disposição do consumidor são mais diversos e plurais criando um novo contexto de acesso a cultura no país. A lei foi resultado de um processo de negociação cuidadoso que durou mais de quatro anos, e é resultado do maior consenso possível neste cenário. Não é à toa que ela conta com grande aceitação e enorme entusiasmo por parte de produtores e programadores que antes não conseguiam sequer se inserir neste mercado.

A resposta para as perguntas que questionam se esse novo ordenamento jurídico prejudica o consumidor, a livre iniciativa, a liberdade de escolha ou a liberdade de expressão é exatamente a mesma: Não, pelo contrário: liberdade de expressão, escolha, livre iniciativa e consumidores saem ganhando com a nova regra."