por Samantha Maia
Fonte: Carta Capital
Há
pouco mais de um ano, 70% dos brasileiros nunca tinham ouvido falar em
livros digitais. A experiência com essa leitura, em geral de obras
disponibilizadas em PDF gratuitamente na internet, era considerada uma
opção de segunda linha, incapaz de superar o papel. O mercado digital
muda, porém, de maneira veloz. A aposta recente das grandes empresas
vendedoras de e-books no Brasil – Amazon, Apple e Google – e a
movimentação das maiores redes de livrarias brasileiras – Livraria
Cultura e Saraiva – para não ficarem atrás no negócio marcam a entrada
de vez do novo produto no País. “É um caminho sem volta”, diz Hubert
Alqueres, da Câmara Brasileira do Livro (CBL), representante das
editoras.
A Apple iniciou as vendas de e-books brasileiros em
outubro de 2012, por meio da iTunes. Em dezembro foi a vez do Google,
com o Google play, e da Amazon, com seu site brasileiro. Alex Szapiro,
vice-presidente do Kindle da Amazon do Brasil, conta que a empresa
estudou o mercado durante um ano e meio. “Viemos pelo potencial
brasileiro de ser um dos maiores mercados do mundo.” A Livraria Cultura e
a Saraiva já comercializavam livros digitais desde 2010, mas o volume
de obras disponíveis equivalia a 10% do que existe hoje.
O
acervo continua pequeno comparado a mercados maduros. São 15 mil títulos
em português, diante de 1 milhão de obras nos Estados Unidos, onde as
vendas de e-books começaram nos primórdio dos anos 2000. No mercado de
livro impresso, 58 mil títulos foram lançados apenas em 2011. Os
investimentos das editoras para a conversão dos arquivos devem, no
entanto, impulsionar rapidamente o número de obras brasileiras
disponíveis em formato digital.
Uma novidade importante
foi o governo federal publicar, há duas semanas, um edital para a
compra de 80 milhões de livros digitais didáticos, com entrega prevista a
partir de 2015. A iniciativa casa com a aquisição recente de 600 mil
tablets para professores. Pelo fato de 30% do faturamento do setor
editorial brasileiro vir de encomendas governamentais, a primeira compra
pública de e-books é um passo decisivo para organizar esse mercado e
derrubar o custo de produção.
A difusão dos tablets e dos
smartphones no Brasil foi importante para aumentar a atratividade dos
e-books com o ganho da mobilidade. Em 2012, cerca de 3 milhões de
tablets foram vendidos no País. O livro eletrônico tem, porém, um
instrumento próprio que ainda não é comum entre os brasileiros: o
e-reader, ou leitor digital. São aparelhos leves, com menos de 200
gramas, dimensão em média de 6 polegadas e tela sem brilho, que cansa
menos a vista. Custam de 300 a 400 reais, têm memória para armazenar
mais de mil livros e bateria que dura até 30 dias. É em torno de tais
dispositivos que está centrada a disputa no mercado local. Mais do que
nos preços, hoje em média 30% mais baixos que os livros convencionais, e
no acervo, ainda com pouca diferença -entre os concorrentes.
Há
cinco anos, a americana Amazon lançou o Kindle, por meio do qual é
possível comprar, baixar e ler os livros digitais adquiridos em seu
site. A multinacional trabalha com um formato de arquivo de e-books
próprio, o KF8, diferente do resto do mercado, que usa o Epub. Com a
aproximação da Amazon do território brasileiro, as demais varejistas
ligaram um sinal de alerta, e a Livraria Cultura correu para divulgar a
parceria com a Kobo, fabricante japonesa de e-readers. A venda de dois
tipos de dispositivos nas lojas da Cultura foi iniciada na quarta-feira
23. Todo o cuidado é tomado porque quem comprar um Kindle não vai
consumir livros da Livraria Cultura e da Saraiva, por exemplo, pois o
dispositivo não lê o formato Epub. Os dois formatos podem, no entanto,
ser abertos em computadores, tablets e smartphones, via programas ou
aplicativos próprios.
“Não olhamos o nosso modelo de negócio
como aberto ou fechado. Você compra um título na Amazon e pode lê-lo em
múltiplas plataformas: no PC, no Mac, no iPhone, no iPad, no Android. É
só baixar os nossos aplicativos Kindle”, defende Szapiro. Arquivos em
PDF também podem ser lidos no dispositivo da Amazon.
Onde o e-reader
caiu no gosto dos consumidores, registra-se, a Amazon abocanhou fatias
consideráveis das vendas com o seu Kindle. Na dúvida sobre o melhor
aparelho, e a considerar a limitação das diferenças de formatos,
clientes se perguntam a que -conteúdo poderão ter acesso a partir de
cada um. Apesar de as empresas afirmarem que a busca por títulos
exclusivos deve ser estratégica, seus catálogos, por enquanto, oferecem
em grande parte best sellers e obras tradicionais.
A parceria
com o Kobo trouxe um catálogo de 1 milhão de títulos para a Cultura,
mas apenas 15 mil nacionais. A expectativa de Sergio Herz,
presidente-executivo da empresa, é de que as vendas de e-books dobrem em
2013 e impulsione os lançamentos das editoras. “É um mercado em
transição, estamos aprendendo ainda com ele. Consideramos o catálogo
atual bom e está crescendo.” A Amazon tem 13 mil livros nacionais e a
Saraiva, 15 mil. “Conseguimos acrescentar 350 títulos ao nosso catálogo
apenas em janeiro”, diz Marcilio Pousada, diretor-presidente da Saraiva.
As livrarias menores,
perto de 3,5 mil no País, são desafiadas a adaptar-se ao novo cenário,
mas ainda não encontraram uma maneira de competir com as grandes redes.
Uma estratégia deve ser definida até o fim do ano. A Associação Nacional
das Livrarias (ANL) chegou a apresentar um pedido ao governo de
proteção ao setor. A carta aberta traz sugestões como o estabelecimento
de um intervalo de 120 dias entre o lançamento de livros impressos e os
digitais, o desconto máximo de 30% do e-book sobre o preço do impresso,
no caso das livrarias, ou de 5% no caso de venda direta da editora ou
distribuidora. “Somos importantes para manter a bibliodiversidade, um
papel que tem de ser mantido no mercado digital”, diz Ednilson Xavier,
presidente da ANL.
Os escritores, por sua vez, esperam
conseguir vender mais e obter maior participação nas vendas. No livro
impresso, os contratos garantem de 10% a 12% do preço de capa para o
autor, e no caso de e-books, o repasse tem sido de 40% a 45%. “Esperamos
conseguir uma participação de 70% a 80%, pois os livros digitais são
mais baratos para as editoras”, diz Joaquim Maria Botelho, presidente da
União Brasileira dos Escritores (UBE). Segundo as editoras, não existe
regra para esse porcentual. “A queda de custos pode, sim, beneficiar os
escritores, mas isso depende de cada contrato”, diz Alqueres, da CBL
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