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segunda-feira, 10 de novembro de 2014

por que é preciso democratizar a mídia: a homogeneização ideológica - II

Em manifesto, economistas rejeitam ajuste fiscal como única via de política econômica


Revista Fórum, novembro 6, 2014 13:12
Em manifesto, economistas rejeitam ajuste fiscal como única via de política econômica

Para especialistas, imprensa tradicional quer impor política econômica que foi derrotada nas urnas
Por Redação
Um manifesto capitaneado por Maria Conceição Tavares, Luiz Gonzaga Belluzzo, Marcio Pochmann e outros pensadores da economia brasileira faz um contraponto ao que tem sido apregoado pelos meios de comunicação tradicionais no que diz respeito às políticas econômicas que o segundo mandato de Dilma Rousseff deve seguir.
Para eles, o resultado do processo eleitoral deixou claro que a maioria da população brasileira “rejeitou o retrocesso às políticas que afetam negativamente a vida dos trabalhadores e seus direitos sociais”. Criticam também aquilo que chamam de opinião única a respeito do rumo certo à economia brasileira divulgada por jornais e revistas.
“(…) os meios de comunicação propagaram quase exclusivamente a opinião que a austeridade fiscal e monetária é a única via para resolver nossos problemas. Isto vai na contramão da opinião de economistas de diferentes matizes no Brasil, mas reverbera o jogral dos porta-vozes do mercado financeiro. Estes defendem solucionar a desaceleração com a “credibilidade” da adesão do governo à austeridade fiscal e monetária, exigindo juros mais altos e maior destinação de impostos para o pagamento da dívida pública, ao invés de devolvê-los na forma de transferências sociais, serviços e investimentos públicos”, diz o manifesto.
Em outro momento, o manifesto também rejeita o argumento que relaciona gasto público e inflação. “Tampouco compreendemos o argumento que associa a inflação ao gasto público representado por desonerações que reduzem custos tributários e subsídios creditícios que reduzem custos financeiros. A inflação, aliás, manteve-se dentro da meta no governo Dilma Rousseff a despeito de notáveis choques de custos como a correção cambial, o encarecimento da energia elétrica e a inflação de commodities no mercado internacional”, criticam os economistas.
Os economistas se revelam preocupados com a “carência de bens públicos”. “O que nos preocupa é a possibilidade de recessão e a carência de bens públicos e infraestrutura social reclamada pela população brasileira. Atendê-la não é apenas um compromisso político em nome da inclusão social, é também uma fronteira de desenvolvimento, estímulo ao crescimento da economia e em seguida da própria arrecadação tributária”, analisam.

A seguir, confira o manifesto na íntegra:
“Economistas pelo desenvolvimento e pela inclusão social
A campanha eleitoral robusteceu a democracia brasileira através do debate franco sobre os rumos da Nação. Dois projetos disputaram o segundo turno da eleição presidencial. Venceu a proposta que uniu partidos e movimentos sociais favoráveis ao desenvolvimento econômico com redistribuição de renda e inclusão social. A maioria da população brasileira rejeitou o retrocesso às políticas que afetam negativamente a vida dos trabalhadores e seus direitos sociais.
É de se esperar que o pluralismo de opiniões fortaleça nossa democracia depois da pugna eleitoral. Desde 26 de outubro, contudo, a difusão de ideias deu a impressão de que existe um pensamento único no diagnóstico e nas propostas para os graves problemas da sociedade e da economia brasileira.
Sem o contraponto propiciado pela campanha e pelo horário eleitoral gratuito, os meios de comunicação propagaram quase exclusivamente a opinião que a austeridade fiscal e monetária é a única via para resolver nossos problemas. Isto vai na contramão da opinião de economistas de diferentes matizes no Brasil, mas reverbera o jogral dos porta-vozes do mercado financeiro. Estes defendem solucionar a desaceleração com a “credibilidade” da adesão do governo à austeridade fiscal e monetária, exigindo juros mais altos e maior destinação de impostos para o pagamento da dívida pública, ao invés de devolvê-los na forma de transferências sociais, serviços e investimentos públicos.
Subscrevemos que este tipo de austeridade é inócuo para retomar o crescimento e para combater a inflação em uma economia que sofre a ameaça de recessão prolongada e não a expectativa de sobreaquecimento.
O reforço da austeridade fiscal e monetária deprimiria o consumo das famílias e os investimentos privados, levando a um círculo vicioso de desaceleração ou mesmo queda na arrecadação tributária, menor crescimento econômico e maior carga da dívida pública líquida na renda nacional.
Entendemos que é fundamental preservar a estabilidade da moeda. Também somos favoráveis à máxima eficiência e ao mínimo desperdício no trato de recursos tributários: este tipo de austeridade, sim, denota espírito público e será sempre desejável. Rejeitamos, porém, o discurso dos porta-vozes do mercado financeiro que chama de “inflacionário” o gasto social e o investimento público em qualquer fase do ciclo econômico.
Tampouco compreendemos o argumento que associa a inflação ao gasto público representado por desonerações que reduzem custos tributários e subsídios creditícios que reduzem custos financeiros. A inflação, aliás, manteve-se dentro da meta no governo Dilma Rousseff a despeito de notáveis choques de custos como a correção cambial, o encarecimento da energia elétrica e a inflação de commoditiesno mercado internacional.
A austeridade agravou a recessão, o desemprego, a desigualdade e o problema fiscal nos países desenvolvidos mesmo tendo sido acompanhada por juros reais baixíssimos e desvalorização cambial. No Brasil, a apreciação cambial estimulada por juros reais altos aumenta o risco de recessão, ao acentuar a avalanche de importações que contribui para nosso baixo crescimento.
É essencial manter taxas de juros reais em níveis baixos e anunciar publicamente um regime fiscal comprometido com a retomada do crescimento, adiando iniciativas contracionistas, se necessárias, para quando a economia voltar a crescer. A atual proporção da dívida pública líquida na renda nacional não é preocupante em qualquer comparação internacional.
O que nos preocupa é a possibilidade de recessão e a carência de bens públicos e infraestrutura social reclamada pela população brasileira. Atendê-la não é apenas um compromisso político em nome da inclusão social, é também uma fronteira de desenvolvimento, estímulo ao crescimento da economia e em seguida da própria arrecadação tributária.
Esta opinião divergente expressa por parte importante dos economistas brasileiros não pode ser silenciada pela defesa acrítica da austeridade, como se o mantra que a louva representasse um pensamento único, técnico, neutro e competente.
Um dos vocalizadores desse mantra chegou a afirmar que um segundo governo Dilma Rousseff só seria levado a caminhar em direção à austeridade sob pressão substancial do mercado, o que chamou de “pragmatismo sob coação”.
Esperamos contribuir para que os meios de comunicação não sejam o veículo da campanha pela austeridade sob coação e estejam, ao contrário, abertos para o pluralismo do debate econômico em nossa democracia.
Maria da Conceição Tavares (UFRJ)
Luiz Gonzaga Belluzzo (UNICAMP e FACAMP)
Ricardo Bielschowsky (UFRJ)
Marcio Pochmann (UNICAMP)
Pedro Paulo Zahluth Bastos (UNICAMP)
Rosa Maria Marques (PUC-SP)
Alfredo Saad-Filho (SOAS – Universidade de Londres)
João Sicsú (UFRJ)Maria de Lourdes Mollo (UNB)
Vanessa Petrelli Corrêa (UFU)
Carlos Pinkusfeld Bastos (UFRJ)
Alexandre de Freitas Barbosa (USP)
Lena Lavinas (UFRJ)
Luiz Fernando de Paula (UERJ)
Hildete Pereira Melo (UFF)
Niemeyer Almeida Filho (UFU)
Frederico Gonzaga Jayme Jr. (UFMG)
Jorge Mattoso (UNICAMP)
Carlos Frederico Leão Rocha (UFRJ)
Rubens Sawaya (PUC-SP)
Fernando Mattos (UFF)
Pedro Rossi (UNICAMP)
Jennifer Hermann (UFRJ)
André Biancarelli (UNICAMP)
Bruno De Conti (UNICAMP)
Julia Braga (UFF)
Ricardo Summa (UFRJ)
William Nozaki (FESP)”

por que é preciso democratizar a mídia: a homogeneização ideológica - I

Dilma ratifica compromisso de democratizar a mídia 

Como mostram as mais de 80 linhas textuais publicadas hoje em O Globo, a chefe de Estado não tocou no assunto tangencialmente. 


Dario Pignotti @DarioPignotti Roberto Stuckert Filho/PR
Em sua condição de presidenta reeleita, Dilma Rousseff abordou pela primeira vez, e com argumentos substanciais, a necessidade de o Brasil debater e eventualmente sancionar um marco jurídico sobre os oligopólios que dominam a produção, circulação e consumo de notícias (privilégio que lhes permite pautar estratégias de desinformação em escala industrial).

Dilma citou as leis que foram aplicadas no Reino Unido contra crimes cometidos por um jornal do conglomerado de propriedade de Rupert Murdoch (uma espécie de Roberto Marinho nascido na Austrália e naturalizado britânico).

Falando para repórteres do jornal O Globo e de outras mídias privadas, a presidenta se referiu à necessidade de superar essa anomalia tipicamente brasileira, a "propriedade cruzada" de mídias eletrônicas e gráficas.

"Oligopólio e monopólio. Por que qualquer setor tem regulações e a mídia não pode ter?", questionou a presidenta diante dos jornalistas e deixou aberta uma potencial discussão sobre como vão se inserir as empresas de telecomunicação.

"Não só a propriedade cruzada. Tem inclusive um desafio, que é saber como fica a questão na área das mídias eletrônicas. O que é livre mercado total? Tenderá a ser a rede social, eu acho".

A presidenta que, em 2013, suspendeu uma visita de Estado a Washington em repúdio à espionagem perpetrada pela agência norte-americana NSA anunciou que impulsionará "um amplo debate a exemplo do que aconteceu com o marco civil da internet. Eu pretendo abrir um processo de discussão a partir do primeiro ou segundo trimestre do ano que vem".

Essas palavras revelam uma discussão política de fundo: iniciar a transição rumo à democracia midiática, o que seguramente vai alimentar a belicosidade do grupo Globo, o maior multimídia sul-americano, e de outras empresas defensoras do atual regime, que pode ser definido como "alegal", já que o Brasil é um dos poucos países onde não há legislação sobre propriedade cruzada.

Acontece que no Brasil impera um regime de exclusão social do espaço público que é pouco visto no resto do mundo, incluindo as potências ocidentais e países latino-americanos cujos governos compreenderam que para consolidar a democracia, em muitos casos recentes, era imprescindível alterar as condições de produção do campo informativo, o que implica desmontar estruturas concentradas e incorporar novos atores através de veículos públicos com generoso financiamento.

E para avançar na matéria, é básico contar com um marco jurídico que regule o sistema. Sem lei, impera a barbárie do mercado jornalístico.

Outra diferença: Enquanto no Brasil o sistema estatal e público é pouco competitivo com as empresas privadas, em outros paises como o Reino Unido e Italia, existem poderosas empresas públicas como BBC e RAI com real capacidade de disputa frente a grupos tentaculares, oligopólicos, como o  controlado por Murdoch ou o multimídia de Silvio Berlusconi.


Dilma cumpre

Durante a campanha encerrada com a vitória de 26 de outubro, Dilma havia dado sinais de sua intenção de abordar um tema espinhoso para o qual deu pouca atenção nos primeiros quatro anos de seu mandato. Por sua vez, o candidato do setor conservador Aécio Neves se posicionou contra qualquer regulamentação, assumindo como seu o discurso das empresas e da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert).

Antes do primeiro turno de 5 de outubro, a candidata do PT concedeu entrevista a vários blogueiros que não se sujeitam à censura do mercado. Foi a primeira vez que a presidenta recebeu a imprensa "independente", no sentido cabal do termo, na residência oficial da Alvorada, reconhecendo seu status político e institucional.

"Uma coisa não tem nada a ver com a outra [regulação econômica e controle de conteúdo]. Regular conteúdo é de país ditatorial. Na regulação econômica vamos impedir que relações oligopólicas se estabeleçam e se instalem. É óbvio que nada tem de bolivariano nisso", disse em 25 de setembro, quando também prometeu que, ao ser eleita, retomaria o assunto.

Semanas mais tarde, poucos dias antes do segundo turno, Dilma e o PT denunciaram as manobras perpetradas pela Veja e adiantaram a intenção de levar o caso à justiça por considerar que a revista da Editora Abril cometera ações criminosas.

Promessas cumpridas

A novidade surgida da entrevista desta quinta-feira concedida ao Globo, Folha de S.Paulo, Estado de S. Paulo e Valor Econômico é que dois meses antes de assumir seu segundo mandato, a presidenta ratificou sua promessa de campanha de revisar o status quo informativo.

Detalhe: a chefe de Estado não tocou no assunto tangencialmente, ou por compromisso em resposta a uma pergunta, mas demonstrou real interesse em assumir o assunto durante alguns minutos, como mostram as mais de 80 linhas textuais publicadas hoje na página 4 do jornal O Globo.

Claro que as grandes mídias matutinas evitaram colocar em destaque a decisão de impulsionar a democracia comunicacional, assunto que, na opinião deste articulista, foi a principal notícia da entrevista. Ao contrário, os jornais hegemônicos preferiram, no geral, destacar que Dilma caminharia rumo a um inevitável ajuste neoliberal.

Com títulos surgidos do que podemos chamar de "pensamento jornalístico único", O Globo, Estado de S. Paulo e Folha de S.Paulo  publicaram, respectivamente, "Dilma diz que vai a controlar gastos e controlar a inflação", "Dilma diz que fará 'dever de casa' contra inflação" e "Dilma sugere contenção de gasto e cerco à inflação". Interessante exemplo de como a propriedade concentrada deriva em homogeneidade ideológica.

A maioria dos jornais não deram a devida importância à fala de Dilma sobre a "dura" legislação inglesa contra as irregularidades jornalísticas, e o julgamento contra o tablóide News of the World, forçado a encerrar suas atividades após o escândalo de escutas ilegais em 2011.
No contexto da guerra suja contra Dilma montada especialmente pelos principais veículos privados se torna inevitável estabelecer um paralelo entre os abusos do britânico News of the World e os excessos cometidos pela Veja desde a quinta 23 de outubro para sabotar a quarta vitória consecutiva do PT.
Como no Brasil, por enquanto, existe o vazio jurídico absoluto , está garantida a impunidade dos patrões e dos editores da publicação semanal da família Civita.

Do contrário, se tivéssemos alguma norma que impusesse limites à realidade hobbessiana da mídia, é possível que os responsáveis pela Veja fossem processados, como foi Rebeca Brooks, mão direita do multimilionário Murdoch, junto de Andy Coulson, ex-porta-voz do premiê britânico David Cameron.
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Dario Pignotti é repórter do diário argentino Página 12 e doutor em Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP).

A tradução é de Daniella Cambaúva.