26/jan/2015, 9h09min
Sul21
“Informação é a melhor arma para enfrentar o preconceito”, diz Tereza Campello
Marco Weissheimer
“O
Brasil Sem Miséria acabou implementando um padrão de inovação nas
políticas sociais brasileiras que coloca um ponto de não retorno”.
Foto:
Roberta Fofonka/Sul21
Após a disputa eleitoral de 2014, houve um grande crescimento do
volume de manifestações preconceituosas contra vários setores da
sociedade, em especial negros, pobres e nordestinos. O fenômeno não é
novo, mas reapareceu com força no final do ano passado.
“O que piorou
muito não está relacionado à media da opinião da população. O problema
está entre aqueles setores mais reacionários que nutrem uma coisa
racista contra os mais pobres. Essas pessoas passaram a ter coragem de
expressar seus preconceitos mais abertamente. Saíram do armário”, diz a
ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello.
Em entrevista ao
Sul21, Tereza Campello analisa as
causas desse tipo de preconceito e defende que a informação é a melhor
arma para combatê-lo. “Recentemente tivemos o caso de uma jornalista que
disse que os pobres só pensam em procriar. É um negócio inacreditável.
Os dados sobre taxa de fecundidade no Brasil, hoje, são completamente
conhecidos. A taxa de fecundidade brasileira caiu em todas as classes
sociais e caiu muito mais entre os mais pobres, uma queda em torno de
50% acima da média nacional”, exemplifica.
A ministra também fala sobre o
atual estágio das políticas sociais no Brasil, aponta as prioridades
para o próximo período e nega que programas como o Bolsa Família possam
sofrer cortes em função de medidas de ajuste fiscal.
Sul21: Em que ponto estamos hoje no processo de construção de
políticas sociais iniciado no primeiro governo Lula e que entra agora
em seu quarto governo? Quais são os planos do MDS daqui para frente,
qual o olhar para o futuro?
Tereza Campello: Estamos em um ponto parecido ao que
estávamos quando a presidenta Dilma assumiu. Naquele momento, quando
olhávamos para trás víamos oito anos de muito sucesso que tiveram como
carro chefe a agenda social e como resultados a inclusão de milhões de
brasileiros, a geração de empregos e muitos investimentos na área
social. Parecia que não era possível avançar numa agenda que já tinha
avançado tanto e que o trabalho a ser realizado era basicamente de
manutenção. Aí a presidenta lançou um mega e ousado plano que foi o
Brasil Sem Miséria. Acho que as pessoas não têm muita noção da dimensão
desse programa. Nós não fomos tão bem tratados pela mídia tradicional,
mas nós também somos ruins de comunicação.
Sul21: Qual é essa dimensão do Brasil Sem Miséria que não ficou bem visível para a sociedade?
Tereza Campello: O Brasil Sem Miséria acabou
implementando um padrão de inovação nas políticas sociais brasileiras
que coloca um ponto de não retorno. Cada vez que se avança muito, se
estabelece um novo degrau. Acho que estabelecemos uma verdadeira laje,
que nos dá bagagem para dar um salto muito superior. A presidenta fez
algumas inflexões nas políticas sociais que são pouco conhecidas.
Sul21: Que inflexões foram essas?
“Agora chegamos num patamar em que é possível dizer: o Bolsa Família está universalizado”. Foto: Roberta Fofonka/Sul21
Tereza Campello: Em primeiro lugar, estabeleceu a
ideia de que precisamos universalizar a rede de proteção social no
Brasil. Isso não estava colocado. Agora chegamos num patamar em que é
possível dizer: o Bolsa Família está universalizado. Certamente ainda
tem gente que está fora, mas é muito residual. No caso de qualquer
política em que falta abranger 150 mil famílias em um universo de 50
milhões, você pode dizer que universalizou. Mas isso não aconteceu por
acaso. Foi uma determinação da presidenta Dilma. Ela determinou que
fizéssemos uma busca ativa. Se há pessoas fora do sistema, é
responsabilidade do Estado ir buscá-las. A responsabilidade é do Brasil
Sem Miséria. Isso muda a equação. Essas pessoas são tão pobres, estão
tão distantes e foram tão excluídas e abandonadas que não chegarão ao
Estado brasileiro. Então, o Estado deve ir buscá-las.
A segunda inflexão, que diz respeito a algo que também não existia
nas políticas públicas voltadas à população pobre no Brasil, é
estabelecer uma linha abaixo da qual o Estado não aceita mais que as
pessoas estejam. Uma coisa é ter um conceito de linha de pobreza para
medir e poder fazer quantificações. Outra coisa é ter uma linha e
estabelecer que, quem estiver abaixo dessa linha, terá uma
complementação de renda garantida pelo Estado. Isso não é apenas um
ditame, mas vem acompanhado de uma política pública que vai dar conta do
problema. Introduziu uma mudança no Bolsa Família, fazendo com que o
benefício variasse para completar a renda de quem estivesse abaixo da
linha da pobreza. Essa foi uma mudança muito importante não só no que o
Estado brasileiro assumiu para ele, como de referência para outros
países. Tem gente que olha e não acredita que estamos fazendo isso. De
fato, é uma inovação muito grande.
É óbvio que só foi possível fazer essas inflexões porque havia oito
anos de governo Lula atrás. Houve ainda uma terceira grande inflexão que
consistiu em dizer: não é só renda; nós queremos que os adultos tenham
acesso a oportunidades para melhorar a sua renda. Isso envolve, entre
outras coisas, capacitação profissional, acesso a bancos, possibilidade
de formalização via carteira assinada, micro ou pequena empresa,
cooperativa, economia solidária. Nós fizemos uma ação massiva muito
forte de inclusão econômica dessa população. Isso não quer dizer que
essas pessoas não trabalhassem. Trabalhavam (e trabalham). O que não
tinham era qualificação profissional, tecnologia, informação, acesso a
crédito, etc.
“Independente
da existência de grandes políticas universais em áreas como saúde e
educação,
se você não tiver um caminho diferenciado a população pobre
não acessa os serviços públicos”.
Foto: Roberta Fofonka/Sul21
A última coisa, falando das inflexões, é que ficou claro para o
Estado brasileiro uma coisa que, de certa forma, é óbvia, mas que não
estava tão institucionalizado e que o Brasil Sem Miséria transformou em
legado. É a noção de que, independente da existência de grandes
políticas universais em áreas como saúde e educação, se você não tiver
um caminho diferenciado a população pobre não acessa os serviços
públicos. Queremos creches para todos, mas se tivermos um caminho
tradicional de universalização, os últimos a serem universalizados serão
os mais pobres. Queremos a possibilidade de que todos façam tomografia,
mas, pelos caminhos tradicionais, os mais pobres serão os últimos a
fazer. E assim por diante…
Então, para construir uma agenda de equidade dentro de uma política
de universalização é preciso ter um caminho diferente que faça com que
os mais pobres sejam incluídos ao mesmo tempo em que os outros, que não
sejam os últimos a serem atendidos. É preciso ter um caminho
diferenciado para essa faixa da população ter acesso à creche, ao Mais
Médicos, a uma escola em tempo integral, ao crédito, etc.
Sul21: E esse caminho diferenciado é também, ele próprio, uma política pública…
Tereza Campello: São várias políticas. O Brasil Sem
Miséria construiu esse espaço. Todo mundo sentava à mesa para discutir,
por exemplo, como fazer para que a escola em tempo integral chegasse aos
mais pobres, como fazer para que as comunidades mais pobres não fossem
as últimas a terem acesso a essa escola. A partir daí fomos construídos
vários caminhos para atingir esse objetivo.
Sul21: Qual é o universo de pessoas que é objeto da busca
ativa hoje? Quantas famílias ainda não tem acesso às políticas públicas
do Estado brasileiro?
“O
que melhor expressa a nossa ambição é aquela frase da presidenta Dilma
na posse: nenhum direito a menos, nenhum passo atrás”. Foto: Roberta
Fofonka/Sul21
Tereza Campello: A nossa estimativa é de um
universo de 150 mil famílias, algo em torno de 600 mil pessoas. É muita
gente ainda. Além disso, temos que fazer um esforço gigantesco para
impedir que as pessoas que melhoraram de vida e que foram incluídas
voltem à situação anterior de pobreza. Nós não podemos deixar que isso
aconteça em hipótese alguma. O que melhor expressa a nossa ambição é
aquela frase da presidenta Dilma na posse: nenhum direito a menos,
nenhum passo atrás. É uma frase muito forte que afirma que não vamos
recuar em direitos.
O Brasil Sem Miséria fechou um ciclo. Não que não existam mais
pessoas a serem buscadas, mas cumprimos com todas as metas que havíamos
definido para esses últimos quatro anos. Elaboramos um diagnóstico
conjunto no governo, organizamos um conjunto de políticas, criamos um
sistema de monitoramento, executamos e entregamos tudo, algumas coisas
acima das metas fixadas e outras que nem estavam previstas.
Sul21: Como funciona esse processo de busca ativa na prática?
Tereza Campello: Ele ocorre de várias maneiras, pois
o Brasil tem regiões e situações muito diferentes. Fizemos, por
exemplo, alguns mutirões com barcos em reservas extrativistas na
Amazônia, e encontramos pessoas muito pobres que ainda não havíamos
localizado e que não tinham nem documentos. Chegamos a encontrar quatro
gerações de uma mesma família sem qualquer documento, nem certidão de
nascimento. Essa situação melhorou muito, pois o governo fez um esforço
gigante, principalmente por meio do Ministério do Desenvolvimento
Agrário com a política nacional de documentação de registro civil. Mais
de um milhão de documentos foram emitidos com essa política. Nós
contratamos a Marinha que acabou fazendo 120 lanchas que foram
distribuídas a municípios da região Norte, com o objetivo de localizar
essas famílias.
Também realizamos busca ativa em algumas regiões metropolitanas. Em
São Paulo, por exemplo, aumentou muito o número de pessoas beneficiadas
pelo Bolsa Família. Quando Fernando Haddad assumiu em São Paulo, essa
busca passou a ser política da prefeitura. Aqui no Rio Grande do Sul
tínhamos uma baixa cobertura também que melhorou bastante nos últimos
anos. Houve mutirões aqui também. Em resumo, há diferentes formas de
implementar a busca ativa. Foram sendo construídos desenhos adequados às
diferentes realidades encontradas no país.
Sul21: Há um debate agora, no início do segundo governo
Dilma, sobre os rumos da política econômica. Fala-se da necessidade de
ajustes e de alguns cortes no orçamento da União. Esses ajustes e cortes
representam, na sua avaliação, alguma ameaça para a continuidade das
políticas sociais?
Tereza Campello: Não há risco de cortes de
benefícios ou de serviços sociais. O que todo mundo vai ter que fazer é
um esforço para diminuir gastos da máquina. Sempre é possível melhorar
aí. Nós temos também mecanismos de controle dentro de nossos programas
para localizar pessoas que estejam recebendo benefícios de forma
indevida. Isso não tem a ver com o ajuste fiscal, mas sim com nosso
esforço permanente para ter uma política cada vez mais eficiente, que
chegue aqueles que mais precisam. Podem ocorrer algumas coisas que não
têm nada a ver com cortes. Nós fizemos, por exemplo, 750 mil cisternas.
Praticamente universalizamos as cisternas na região do Semi Árido. Ainda
há cisternas a serem feitas, algo em torno de 50 mil por ano. Nós
estávamos fazendo 50 mil a cada dois meses. Então se olharmos para o
dinheiro disponível para cisternas, veremos que ele é muito menor do que
já foi, mas isso se deve ao sucesso que tivemos no cumprimento de
nossas metas.
“Hoje
temos 14 milhões de famílias dentro de nosso radar. Nós sabemos onde
essas famílias estão, criamos uma ferramenta no Brasil que é a nossa
tecnologia social mais difundida no mundo”. Foto: Roberta Fofonka/Sul21
Sul21: A senhora tem qualificado, em algumas ocasiões,
programas como o Bolsa Família como construtores de políticas e
instrumentos de reforma do Estado brasileiro. Poderia detalhar um pouco
mais essa qualificação?
Tereza Campello: Hoje temos 14 milhões de famílias
dentro de nosso radar. Nós sabemos onde essas famílias estão, criamos
uma ferramenta no Brasil que é a nossa tecnologia social mais difundida
no mundo. Nós exportamos hoje essa ideia do cadastro único. Temos um
espaço de registro que não serve apenas para pagar o Bolsa Família. Ele
fornece informações sobre essas famílias e é alimentado por outras
fontes também. Nós estamos alimentando o cadastro do Bolsa Família, por
exemplo, com dados do Banco Central sobre microcrédito. Nos interessa
saber se essas famílias têm acesso a crédito, não com o objetivo de
fazer algum tipo de fiscalização, mas para poder criar outras
ferramentas que possam auxiliá-las. Esse tipo de cruzamento de dados
permite também um olhar mais apurado sobre os territórios onde essas
famílias vivem e sobre possíveis oportunidades para melhorar a sua
qualidade de vida.
Nós fizemos isso com o Mais Médicos. O novo decreto do programa repete
esse mesmo desenho que permite, entre outras coisas, apontar onde há
mais problemas para os médicos irem. Pegamos o mapa do Bolsa Família e
colocamos sobre o território brasileiro, localizando as regiões onde
havia posto de saúde e onde havia maior concentração de população pobre.
Isso nos ajudou a definir as regiões onde a necessidade de médicos era
mais urgente. Esse é um exemplo do que chamo de papel construtor de
outras políticas desempenhado pelo Bolsa Família. Nós precisamos avançar
agora em controle social.
Sul21: Por onde passa esse avanço?
Tereza Campello: Passa por várias coisas. Estou
pensando muito neste tema agora. Considere o Bolsa Família, por exemplo.
É um programa pulverizado, onde as famílias recebem o benefício. Há
alguns elementos de transparência que nos ajudam com o controle público.
Todos os beneficiários estão com o nome no Portal da Transparência.
Quem quiser saber se o vizinho recebe Bolsa Família pode descobrir
acessando esse portal. Esse é um passo importante que ajuda o controle
social. Nós queremos que cada município tenha seu conselho de
assistência social. Temos pressionado para que isso aconteça. Não é uma
relação simples, pois temos entidades filantrópicas, gestores públicos,
usuários e movimentos sociais com assento nesses conselhos. Mas é só
assim que se constrói controle social, com as pessoas e entidades
envolvidas sentando em volta de uma mesa e estabelecendo um espaço de
diálogo. Um exemplo disso é o que vem acontecendo no Conselho Nacional
de Assistência Social e no Conselho Nacional de Saúde onde temos, pela
primeira vez, representantes da população de rua. São setores muito
organizaram que se mobilizaram, criaram a sua institucionalidade e vem
participando e cobrando o setor público.
“O nível de preconceito que emergiu na sociedade neste período pós-eleitoral é algo assustador”. Foto: Roberta Fofonka/Sul21
No Brasil Sem Miséria, nós fizemos seis diálogos com diferentes
grupos da sociedade civil. Ouvimos críticas e sugestões antes de
concluir o formato final do programa. Nós temos um espaço de diálogo e
participação social muito forte, com gente muito qualificada e
comprometida com uma agenda de avanço das políticas sociais. Agora,
nenhum desses atores representa, de fato, aqueles mais pobres que
geralmente não estão sindicalizados ou organizados em torno de alguma
entidade. Então, nós temos um desafio colocado para o Estado e para os
setores organizados da sociedade que consiste em ouvir a voz dessas
pessoas. Hoje, ela começa a aparecer em tudo o que é lugar. Não é mais
uma coisa esporádica. Agora, há muitos casos onde as pessoas não têm
coragem de falar por conta do preconceito. O nível de preconceito que
emergiu na sociedade neste período pós-eleitoral é algo assustador.
Sul21: Qual a sua avaliação sobre a crescente emergência
dessas manifestações de preconceito contra setores mais pobres da
população, vistas neste período mais recente?
Tereza Campello: Eu acho que piorou. Nós tivemos um
período muito ruim do começo do governo Lula até 2005, 2006. Foi algo
muito violento. Depois essas manifestações de preconceito diminuíram. Os
raivosos pararam de falar e passaram a ficar envergonhados diante dos
resultados muito efetivos que obtivemos. Hoje, mesmo com toda a tensão e
radicalização verificada na última campanha eleitoral, a maioria da
população brasileira é a favor do Bolsa Família. Cerca de 70% da
população é favorável ao programa. O que muitas pessoas dizem é que não
pode ser só isso, o que nós também achamos. Por isso temos o Pronatec,
cursos de formação profissional, programas de crédito. O próprio Bolsa
Família é também escola e educação.
O que piorou muito não está relacionado à media da opinião da
população. O problema está entre aqueles setores mais reacionários que
nutrem uma coisa racista contra os mais pobres. Essas pessoas passaram a
ter coragem de expressar seus preconceitos mais abertamente. Saíram do
armário. A impressão é que aumentou muito o número dos que são contra
programas como o Bolsa Família, quando na verdade o que aumentou foi o
número dos que têm coragem de falar esse monte de barbaridade, inclusive
coisas que não têm a menor aderência com a realidade.
Recentemente tivemos o caso de uma jornalista que disse que os pobres
só pensam em procriar. É um negócio inacreditável. A pessoa parece
letrada, embora não deva ter ido muito longe para falar uma coisa
dessas. Os dados sobre taxa de fecundidade no Brasil, hoje, são
completamente conhecidos. A taxa de fecundidade brasileira caiu em todas
as classes sociais e caiu muito mais entre os mais pobres, uma queda em
torno de 50% acima da média nacional.
Então, não tem o menor cabimento as pessoas continuarem repetindo
esse tipo de coisa. Por que repetem? Fico pensando nisso. Outra
barbaridade que segue sendo dita é que a pessoa é pobre porque não
trabalha. A pessoa é pobre porque é preguiçosa ou porque é uma
perdedora, ou as duas coisas juntas. A verdade é que raríssimas pessoas
que não se alimentaram bem na infância, que não tiveram oportunidades de
formação e tiveram que começar a trabalhar muito jovens, conseguem
posições melhores nas suas áreas. A violência dessas manifestações de
preconceito constrange quem é pobre, pois difunde, entre as crianças,
essa ideia de que a pessoa é pobre porque não trabalha, porque é
preguiçosa.
“Tem
gente que acha que, para uma família receber o benefício do Bolsa
Família, basta ter as crianças matriculadas na escola. Não é isso. A
criança tem que frequentar a escola e conferimos a cada mês se ela tem
um mínimo de 80% de frequência.” Foto: Roberta Fofonka/Sul21
Sul21: Isso envolve, entre outras coisas, uma disputa
cultural e simbólica. No início dessa entrevista, você se referiu a
problemas de comunicação. Em que medida esses problemas contribuem para o
problema do agravamento do preconceito? Caberia ao governo algum tipo
de política nesta área?
Tereza Campello: Contra o preconceito eu acho que
cabe sim. Acredito que a melhor arma contra o preconceito é a
informação. Tem um monte de gente que repete essas barbaridades por que
não tem informação. Ouve alguém falar, acha engraçadinho e sai repetindo
a bobagem, que nem essa história dos “pobres gostam de procriar”. A
pessoa que disse isso talvez não seja permeável a nenhum tipo de
informação e de cultura. Mas, certamente, muita gente que leu essa
bobagem sai repetindo sem saber o que está falando. Então, precisamos
melhorar a nossa capacidade de transmitir informação clara e de
qualidade para a população.
Tem gente que acha que, para uma família receber o benefício do Bolsa
Família, basta ter as crianças matriculadas na escola. Não é isso. A
criança tem que frequentar a escola e conferimos a cada mês se ela tem
um mínimo de 80% de frequência. O nível de exigência sobre essa família é
forte e positivo para o país, pois visa garantir a permanência dessa
criança na escola. Por maiores problemas que tenha a escola, nela a
criança tem acesso a um ambiente mais organizado, ao convívio com outras
pessoas, tem acesso à informação, e está fora da rua e do trabalho
infantil.
Perguntei em um programa de rádio do qual participei recentemente
quantas crianças temos na escola hoje no Brasil. Ninguém soube
responder. São 17 milhões de crianças. Esse número aumentou muito graças
também ao Bolsa Família. Esse é o tipo de informação que eu acho que
tocaria muita gente. Por mais conservadora que a pessoa seja, se ela
souber que o Bolsa Família tem esse impacto sobre a saúde e a educação
das crianças, pode mudar sua visão.