sábado, 30 de junho de 2012

O homem primitivo de hoje


HOMO ERECTUS



Social Media Day #smday

Hoje acontece o Social Media Day! 




Centenas de cidades do mundo vão celebrar o Social Media Day com eventos que irão tratar de assuntos ligados às conexões via redes sociais ao redor do mundo.

Várias cidades brasileiras terão programação especial com convidados para a data, como São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Porto Alegre (RS), Belo Horizonte (MG), Salvador (BA), Recife (PE), Macéio (AL), entre outras e em Americana não será diferente. O evento acontece pela segunda vez na cidade e visa aproximar profissionais, estudantes e curiosos além das redes sociais, para falar da comunicação digital.





Quer participar? Visite a página do Social Media Day no Facebook (http://www.facebook.com/SMDayAmericana), lá você faz o seu cadastro e fica sabendo todos os horários e detalhes da programação. Aproveite e agite sua turma para curtir junto com você. Afinal, em um evento de interação, quanto mais gente, melhor!


Onde: Teatro de Arena Elis Regina | Rua Piauí, 1080 - Jd. Colina - Americana / SPQuando: Sábado, 30 de Junho, a partir das 14hEntrada: 1 kg de alimento não perecível

Fora do país, Buenos Aires (Argentina), Nova Iorque (Estados Unidos), Toronto (Canadá), Barcelona (Espanha), Tóquio (Japão), Joanesburgo (África do Sul), também estão entre os locais que irão realizar atividades específicas para celebrar o dia.
O primeiro Social Media Day foi comemorado a dois anos atrás, uma inciativa tomada pelo site Mashable. Desde então, a data é comemorada anualmente com atividades, e 90 países já realizaram encontros relacionados com o assunto, em mais de 700 eventos realizados pelo mundo.
Não fique de fora, participando dos eventos pessoalmente ou através da hashtag #smday. Definitivamente é um dia a ser comemorado, pois as redes sociais foram uma das maiores revoluções já vistam em relação a relacionamentos e união de pessoas atrás dos mesmos objetivos no mundo todo.
Várias manifestações feitas através dessas redes sociais tiveram uma repercussão tão grande, que algumas delas até mesmo mudaram o curso de situações e movimentos criados. As redes sociais são a prova cabal de que, quando o povo se une para atingir um objetivo, ele pode ser atingido.





Site do Social Media Day em São Paulo.





terça-feira, 26 de junho de 2012

#POLÊMICA

“Sou cachorra chapa quente (...) Sou uma gatinha manhosa/Vou fazer tu derramar/O seu líquido do amor/Ai, que tesão, vou te arranhar”. A letra é de Cachorra Chapa Quente, da funkeira carioca Tati Quebra-Barraco. Ela, Deise da Injeção e As Danadinhas são algumas das representantes, no funk, da demanda por liberdade sexual, que traz junto ao direito ao sexo e ao prazer as bandeiras de igualdade, exatamente como as feministas fizeram na década de 1970. Quando cantam suas letras consideradas obscenas, estão reivindicando mais do que prazer na cama e denunciando as opressões às quais foram historicamente submetidas. De quebra, rompem com os padrões de beleza: nenhuma delas é loura ou magra, e nem por isso deixam de exibir o corpo, dançar ou se apresentar como mulheres desejáveis. Sem nenhum respaldo teórico – e, diga-se de passagem, já sem precisar da teoria, na medida em que a prática da igualdade entre os sexos tem se espalhado na sociedade de forma saudável e natural –, as meninas do funk sabem na pele o que é preconceito: são pobres, negras e faveladas. O que não falta, portanto, é estigma.

Parte das militantes do movimento feminista, porém, prefere não reconhecer o funk e manifestações culturais menos formais como marca da entrada do feminismo na sociedade. No funk, há a crítica de que as músicas apresentam as mulheres como meros objetos sexuais (um lugar de subordinação do qual as feministas lutaram para nos retirar). Mas é preciso admitir os apelos de liberdade sexual da juventude como uma consequência positiva do feminismo.

Valorizar essa liberdade é também um gesto político. Para isso, devemos pensar no feminismo não como um clube exclusivo ao qual se tem acesso por tortuosos caminhos institucionais (quem vende o título deste clube? Onde entregam a carteirinha?), mas como aquilo que o inspirou desde o começo: ser um movimento plural, sem hierarquia, dogmas, controle ou estruturas centralizadas, que não defende uma verdade, mas está em permanente construção de uma agenda em evolução. Assim, devemos mais é comemorar que a pauta da liberdade sexual tenha chegado ao funk – no que se espera que seja um permanente processo de expansão desde as primeiras reivindicações do movimento feminista.

Tudo começou no século 18, quando Olimpes de Gouges, na França, e Mary Wollstonecraft, na Inglaterra, passaram a lutar por direitos civis para as mulheres. A partir da atuação das inglesas, o voto feminino foi conquistado no século 19. Num salto histórico, chegamos aos anos 1950/1960/1970 e à chamada “segunda onda do movimento feminista”. Foi quando entraram em pauta exigências de liberdade em todos os campos da vida social. As bandeiras de luta chegam, então, a temas até aquele período restritos à vida privada, como o direito ao prazer sexual. São campanhas que se expandiram do direito ao orgasmo ao questionamento do papel de dona de casa, e que culminaram nas bandeiras de liberdade individual, hoje cantadas também pelos grupos femininos do funk.

Carla Rodrigues é jornalista, professora e doutora em Filosofia (PUC-Rio).


segunda-feira, 25 de junho de 2012

Impedimento? Golpe? O papel das mídias nos processos políticos

Paraguay: Lugo se sumó a una movilización de estudiantes frente a la TV Pública

Télam |  Agencia Nacional de Noticias de la República Argentina
http://www.telam.com.ar/nota/29411
El destituido presidente paraguayo Fernando Lugo se sumó a la movilización "pacífica" que estudiantes y trabajadores realizan frente a la TV Pública para agradecer su apoyo “como ciudadano”.

“Este camino de manifestación ciudadana pacifica no tiene retorno, yo escuchaba que algunos jóvenes decían aquí nos quedamos; la patria nos llama a una protesta pacífica y yo, como ciudadano paraguayo me sumo, en la plaza, en el campo y en la ciudad” dijo Lugo a la concurrencia.

“Los huérfanos de futuro, los huérfanos democráticos, no podrán torcer la voluntad popular” y resaltó la actitud de los países hermanos latinoamericanos que ya han retirado a sus embajadores de nuestro país” enfatizó Lugo en medio de cánticos que lo aclamaban.

“Hemos aceptado el veredicto injusto de aquel parlamento, pero nosotros nos manifestamos a favor de la paz, de la no violencia” agregó.

También explicó que en las últimas horas del convulsionado país guaraní “teníamos información que (el sector destituyente) querían repetir el marzo paraguayo”.

Además, reiteró que “este pueblo (paraguayo) es pacífico”.

Las expresiones de los estudiantes y trabajadores de la TV pública se siguen sucediendo, mientras Lugo ingresó a las oficinas del edificio sin que se produzcan incidentes.

domingo, 17 de junho de 2012

Cúpula dos Povos - o movimento pela Democratização da Comunicação


Todas as ideias, todas as cores e também todas as vozes

Em plenária da Campanha Nacional em Defesa da Liberdade de Expressão para Todos, realizada na Cúpula dos Povos, movimento pela Democratização da Comunicação constrói agenda de mobilizações em prol de novo marco regulatório da mídia. Disse o sanfoneiro: “Pro Marco chegar precisa fazer pressão/ Congresso compreender que eles têm uma missão/ ou representam o povo ou repassam o bastão”.

Rio de Janeiro - “Todas as ideias, todas as cores, todas as vozes”. Este foi o lema que norteou um dos debates realizado na Cúpula dos Povos da Rio+20 na última sexta-feira (15). A atividade marcou o pré-lançamento da Campanha Nacional em Defesa da Liberdade de Expressão para Todos, reunindo mais de cem militantes sociais em torno de um desafio que pautará a agenda do movimento pela democratização no país no próximo período.

Com o objetivo de pressionar o governo federal pela abertura do debate público em torno de um novo marco regulatório para as comunicações no país e de mobilizar amplos setores da sociedade brasileira na luta por uma transformação estratégica no setor, a Campanha chega num momento em que o tema da liberdade de expressão está no centro do debate dos movimentos sociais. Depois da realização da I Conferência Nacional de Comunicação em 2009 e de uma série de ações e iniciativas dos movimentos em prol de democracia e liberdade para todos e todas na mídia, o desafio de realizar uma Campanha sobre este tema em todo o país é enorme.

“Esta é uma das mais desfiadoras campanhas que os movimentos brasileiros já construíram”, disse Jacira Melo, do Instituto Patrícia Galvão. “Temos um adversário muito poderoso pela frente: o sistema midiático brasileiro e seus veículos, que entram diariamente em nossas casas sem qualquer contraponto”. Para fazer este enfrentamento, os movimentos acreditam que é preciso mostrar, no dia a dia das pessoas, os impactos das violações à liberdade de expressão e do direito à comunicação do conjunto da população brasileira.

Para Rosane Berttoti, coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), que, ao lado de diversas organizações populares, está à frente da campanha, diante da análise da estrutura dos meios de comunicação no país, altamente concentrados, defender a liberdade de expressão significa defender a pluralidade e diversidade de ideias e opiniões na mídia.

“No entanto, sempre que defendemos a liberdade de expressão somos taxados de censores. Mas nosso objetivo é exatamente o oposto: garantir este direito para todos os cidadãos e não somente para alguns que detém o controle dos meios”, disse Rosane. “É um tema estratégico para todos, e por isso deve ser debatido em qualquer lugar, sem barreiras e de forma aberta”, acrescentou, fazendo referência à paisagem natural do Aterro do Flamengo, onde acontece a Cúpula dos Povos da Rio+20.

Agenda atrasada
Na avaliação dos movimentos participantes da Campanha, o país está extremamente atrasado em relação à legislação que rege o setor. No dia 27 de agosto próximo, por exemplo, o Código Brasileiro de Telecomunicações, lei estruturante da área no país, completa 50 anos. Seu conteúdo está longe de dialogar com a realidade das mudanças tecnológicas, da convergência de mídia e, sobretudo, da necessidade de garantia da liberdade de expressão do conjunto da população brasileira.

Mesmo no último período, o governo federal tem deixado a desejar acerca da agenda pública de comunicação no país. Presente à plenária desta sexta, o diretor do Departamento de Acompanhamento e Avaliação de Serviços de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações disse, mais uma vez, que não há prazo para o governo federal abrir a prometida consulta pública sobre as mudanças no marco regulatório brasileiro.

“A sociedade brasileira está atenta a essa questão. A comunicação é um espaço de difusão da diversidade cultural, e ainda temos essa lacuna com espaço midiático monopolizado”, acredita Sergio Mamberti, secretário de Políticas Culturais do Ministério da Cultura. Para ele, foi um retrocesso ter Helio Costa como ministro das Comunicações no governo Lula, o que teria deixado o Ministério ausente deste debate. “Ninguém quer um impeditivo para que as vozes circulem livremente, mas não podemos conviver mais com essa situação”, afirmou.

“O governo tem a responsabilidade política de colocar este debate de forma ampla e participativa, consultando a sociedade. É um debate também que exigirá forte incidência dos movimentos sociais junto à população. A conjuntura mostra que este pode ser um momento importante para este debate público. Episódios da CPI do Cachoeira, por exemplo, reforçam a necessidade de um novo marco regulatório. Assim como as eleições municipais, que podem pautar as políticas públicas de comunicação no âmbito local. São oportunidades que não podemos desperdiçar”, afirmou Rosane Bertotti.

“O desafio agora é fazer com que o debate chegue em todas as pessoas e que o protagonismo em todo o processo seja da sociedade”, completou Ivan Moraes, do Centro de Cultura Luiz Freire, de Pernambuco.

Temas de luta
Entre os temas que devem ser trabalhados na Campanha está a defesa do pluralismo, da diversidade, da diversidade regional, do respeito aos direitos humanos na mídia, assim como a universalização da banda larga.

Refletindo a diversidade dos lutadores pela democratização da mídia, a campanha tem uma coordenação nacional ampliada que, atualmente, conta com mais de 20 entidades. Três grupos de trabalho – formulação, mobilização e comunicação - são responsáveis por definir estratégias e ações nestes eixos. A plenária também orientou para a criação de comitês locais, visando dar a maior capilaridade possível à luta pelo direito à comunicação.

“Trabalharemos para lançar a campanha no período de aniversário de 50 anos do código atual, para o qual não queremos mais cantar parabéns, e estar com a campanha nas ruas em todo o país pós -período eleitoral”, explicou João Brant, do Intervozes, que também integra a coordenação da Campanha.

O ponto alto da plenária foi a participação do sanfoneiro José Sergival, que declamou o cordel “A peleja comunicacional de Marco Regulatório e Conceição Pública na terra sem lei dos coronéis eletrônicos”. Dizem trechos do cordel:

Pega o controle remoto
vai de botão em botão
procurando um bom debate
ou uma contradição
pense num troço difícil
nessa radiodifusão

(...)
Na hora de renovar
essa dita concessão
Não vai ser caldo de cana
Tem que fazer discussão
Porque não tem no canal
lei de usucapião

(...)
E com a propriedade
dos meios de difusão
Nem vertical nem cruzada
pra acabar concentração
vamos democratizar
pra toda população

(...)
Ah, mas pra Marco chegar
precisa fazer pressão
Congresso compreender
que eles têm uma missão
ou representam o povo
ou repassam o bastão


Clique aqui para ler a íntegra do cordel: http://www.comunicacaodemocratica.org.br/cordel/


sábado, 16 de junho de 2012

Quem é quem na luta pelo direito sobre cópias

Compartilhar livro é direito

Pablo Ortellado
Do GPopai

15/06/2012 - O fechamento do site Livros de Humanas, que indexava versões digitais de livros de humanidades para compartilhamento entre usuários, tem causado surpresa, indignação e controvérsia. Criado e mantido por estudantes universitários que não tinham meios econômicos para comprar livros, o site foi fechado após a Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (que representa várias grandes editoras) ajuizar uma ação demandando a retirada dos livros e o pagamento de multa por supostos danos. Disputa judicial à parte, surpreendi-me com o fato de muitos colegas da comunidade acadêmica não estarem suficientemente esclarecidos sobre a profunda injustiça desta ação e não terem ainda notado a admirável coragem do jovem mantenedor do site em defender o seu projeto sob o risco de um grande ônus econômico.

Por isso, gostaria de listar, muito brevemente alguns fatos relevantes para se entender em toda a sua complexidade os conflitos entre o direito público de acesso às obras e o direito patrimonial de editoras e autores. Esses fatos foram levantados em diversos estudos realizados nos últimos anos pelo grupo de pesquisa que coordeno, o GPoPAI – Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação:

* Os estudantes não têm meios econômicos para comprar os livros. A afirmação é trivial e de fácil comprovação empírica. Qualquer estudante pode somar os preços de livros de leitura obrigatória das bibliografias de curso de todas as disciplinas no decorrer de um ano. Em pesquisa mais sistemática que realizamos em 2008, o custo em 10 diferentes cursos da minha unidade na USP variava entre R$ 3.344,75 e R$ 5.810,46. Para mais de 70% dos estudantes, esse valor era superior à renda mensal de toda a família.

* As bibliotecas não têm os meios econômicos para comprar os livros. Como os estudantes não têm nem remotamente os meios para comprar os livros necessários, poder-se-ia esperar que as bibliotecas o fizessem. Tomemos o exemplo acima, da minha unidade, apenas para fins de argumentação. Para simplificar o cálculo, podemos estimar um custo médio de aquisição anual de livros por aluno de 5 mil reais no varejo, ou de cerca de 3 mil reais no atacado (já que estamos falando de compras de grande escala). Supondo que os alunos pudessem comprar 30% dos livros, a aquisição dos 70% restante custaria à unidade 8,4 milhões de reais. Como nosso orçamento anual para a compra de livros é de cerca de 300 mil reais, a aquisição apenas dos livros de leitura obrigatória da graduação tomaria 28 longos anos de orçamento inteiramente dedicado – sem qualquer compra de livros de literatura complementar, de pesquisa ou de pós-graduação. Não preciso dizer que muito antes do final dos 28 anos, a literatura estaria completamente obsoleta.

* Um terço da base bibliográfica está esgotada. Levantamento em 36 instituições e 6 diferentes áreas do conhecimento que fizemos na pesquisa de 2008, assim como levantamentos posteriores que realizamos em diferentes bibliotecas da USP mostram recorrente e homogeneamente, em todas as áreas do conhecimento, que de 25 a 35% dos livros requeridos pelas disciplinas estão esgotados – e, portanto, não podem ser adquiridos no mercado. Como não podem ser comprados, esses livros só podem ser utilizados se fazemos deles cópias reprográficas ou digitais.

* A educação é um direito. O capítulo sobre limitações da nossa lei de direito autoral (9.610/1998) já prevê casos nos quais é permitido o uso de obras sem autorização e sem o pagamento de royalties para fins de interesse público. Os casos ali citados (art. 46) podem ser estendidos por analogia a outros, já que uma decisão recente do STJ considerou-os apenas exemplificativos. Além disso, o direito à educação (e os livros são meios essenciais para a educação) é um direito constitucional (art. 6).

* A repressão às fotocópias e ao compartilhamento é predominantemente extrajudicial. Como um estudo recente coordenado pela Universidade de Columbia mostrou, o combate à pirataria nas “economias emergentes” é predominantemente extrajudicial. Esse combate consiste no fechamento das inciativas “piratas” e no confisco de materiais sem que o mérito das acusações de violação de direito autoral seja julgado no judiciário. Como há enorme desproporção de recursos entre a indústria do direito autoral e os acusados, toda a questão é resolvida com a atividade repressiva e/ou com a ameaça de judicialização (que os pequenos não conseguem enfrentar). Isso permite que os detentores de direito imponham sua visão sobre o direito autoral, frequentemente de maneira abusiva, sem que o público ou os supostos “piratas” tenham condições de defesa. É exatamente essa situação assimétrica que o mantenedor do site está corajosa e pioneiramente enfrentando.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

O direito à memória; o dever de memória

O depoimento de Marilena Chauí no ato pela criação da Comissão da Verdade na USP

Confira abaixo a íntegra do depoimento da filósofa, que defende um resgate histórico para que se possa democratizar a universidade de fato.

Por Redação [13.06.2012 19h30]
Fonte: Revista Forum
 

Confira abaixo o depoimento da filósofa Marilena Chauí no ato pela criação da Comissão da Verdade na USP, realizado ontem, no auditório da Faculdade de Economia e Administração (FEA).
Boa noite a todos e a todas, obrigada pelo convite. Quero começar fazendo duas colocações. A primeira, certamente você sabe, mas sou avó, como alguns colegas de colegial e faculdade. Nós [ela e Heleny Guariba] estudávamos juntas, ela que escolheu o meu namorado, com quem eu casei. Estive com ela na véspera do dia da prisão, foi a minha casa e tivemos uma longa conversa, fizemos planos, íamos nos ver no dia seguinte, mas eu não a vi mais. Entendo o que a Vera [Paiva] diz, levei muitos anos para enterrar, não podia admitir.

A segunda é de um outro colega meu, o [Luiz Roberto] Salinas, que não morreu na prisão, mas morreu por causa da prisão. Foi preso, torturado, e, na época, ele não fazia parte de nenhum movimento ou grupo, nada. Mas tinha feito muito antes, na altura de 64, e isso aconteceu no final dos anos 70. A esposa dele era jornalista e havia publicado uma matéria, os policiais, militares, não entenderam algumas palavras e interpretaram como um código. Foram ao apartamento deles e, como ela não estava, pegaram Salinas, que foi torturado no pau de arara dias a fio para dizer qual era o deciframento do código, das palavras do artigo da mulher dele. Não era código, não havia o que dizer e ele foi estraçalhado. O resultado dessa prisão: foi anulado, evidentemente, o estado físico do Salinas e o seu estado psíquico. Foram anos para ele se refazer, e nunca conseguiu realmente se refazer. Teve trombose nas duas pernas, tendo que cortar dedos dos pés e morreu com uma síncope. Ou seja, foi morto pela tortura. Amigo meu do coração, entramos juntos no Departamento de Filosofia e, juntos, nos tornamos professores no departamento.

Gostaria de contar para vocês como foi entrar no campus da USP em 1969, logo depois de dezembro de 1968, quando foi promulgado o AI 5. Você vinha para cá e não tinha nenhuma garantia de que não seria preso e torturado, portanto, não sabia se seus alunos estariam na classe e, quando você se dava conta de que alguns não estavam, não ousava perguntar se tinham faltado na aula, se tinham partido para o exílio, se já estavam presos ou se já estavam mortos. E a mesma coisa com relação aos colegas. Tínhamos o pessoal do Dops à paisana nas salas de aula e escutas na sala dos professores e no cafezinho. Éramos vigiados noite e dia.

Eu me lembro que em 1975 a Unicamp fez um congresso internacional de historiadores, e convidou Hobsbawn, Thompson, enfim, a esquerda internacional. Houve as exposições dos brasileiros e os estrangeiros disseram: Nós não estamos conseguindo entender nada do que vocês dizem, não entendemos as exposições e sobretudo não estamos entendendo os debates entre vocês. Então, nos demos conta que falávamos em uma língua cifrada para não sermos presos. A esquerda acadêmica criou um dialeto, uma linguagem própria na qual dizia tudo que queria dizer e não dizia nada que fosse compreensível fora do seu próprio circulo. Foi uma forma de auto defesa e uma forma de continuar produzindo, pensando e discutindo. Ao mesmo tempo, essa forma nos fechou num circulo no qual só nós nos identificávamos com nós mesmos. Isso é uma coisa importante, que a Comissão da Verdade traga o fato de você criar um dialeto, criar um conjunto de normas, de regras, de comportamento em relação aos outros, tendo em vista não ser preso, torturado e morto, durante anos a fio.

Costumo dizer aos mais novos que eles não avaliam o que é o medo, pânico. Sair e não saber se volta, sair e não saber se vai encontrar seus filhos em casa, sair e não saber se vai encontrar seu companheiro, ir para a escola e não saber se encontrará seus alunos e colegas. Você não sabe nada. Paira sobre você uma ameaça assustadora, de que tem o controle da sua vida e da sua morte. Isso foi a USP durante quase dez anos, todos os dias. Além das pessoas que iam desaparecendo, desaparecendo... Ao lado das cassações.

Eu teria gostado que a [Eunice] Durham pudesse ter vindo, porque quando ela fez parte da Adusp na gestão do Modesto Carvalhosa, fez o chamado “Livro negro da USP”, que tem o relato de como foram feitas as cassações. As cassações não vieram do alto. As congregações de cada instituto, de cada faculdade, se encarregavam de denunciar, de delatar e de fazer a cassação. Isso é uma coisa que a Comissão da Verdade precisa deixar muito claro, não foram forças lá de fora que fizeram isso, nem militares. Foram os civis acadêmicos, dentro da universidade, que fizeram uma limpeza de sangue. É uma coisa sinistra, mas foram nossos colegas que fizeram isto.

E, impávidos, quando começou a luta pela volta da democracia, quando começaram as greves no ABC, quando começaram as lutas pela diretas etc e tal, eu ia às assembleias da Adusp e do DCE e ficava lado a lado com muitos deles que estavam ali para fazer a defesa do retorno da democracia, quando eles tinham sido apoiadores da ditadura. E isto não pode ficar em branco. Uma Comissão da verdade tem que dizer isto.

E eu gostaria também, como uma contribuição ao trabalho da Comissão da Verdade, de retornar ao que o Eduardo e a Vera disseram, o fato de que a estrutura da nossa universidade, mais do que a estrutura de outras universidades que conseguiram se desfazer disso, é a mesma que a ditadura – através do MEC e do acordo MEC-USAID – introduziu no Brasil e aqui se cristalizou. Primeiro, foi feita uma chamada reforma universitária, e essa reforma universitária introduziu a ideia de créditos, a ideia de disciplinas obrigatórias e disciplinas optativas. Como a sustentação ideológica da ditadura era a classe média urbana, era preciso compensar a classe média pela falta de poder econômico e político e a compensação foi através do prestigio do diploma, abriu-se a industria do vestibular, que veio por decreto.

Ou seja, a universidade que vocês frequentam, a universidade que vocês cursam, a universidade que nós damos aula, é a universidade que foi estruturada a partir do Ato Institucional número 5. Em outras universidades, houve força suficiente, do corpo docente, do corpo dicente, para derrubar muita coisa. A estrutura curricular não, continuamos Brasil afora com disciplinas obrigatórias, optativas, créditos, frequência... A introdução dos créditos significou a escolarização da vida universitária. Em uma universidade você pode fazer duas ou três matérias no máximo e você deve ter duas a três horas de aula por semana para cada uma delas, no máximo. O ideal são duas matérias, cada uma delas com duas horas semanais para que você trabalhe o que ouviu em classe, vá para as bibliotecas e laboratórios, faça pesquisas e tenha efetivamente uma vida universitária. A reforma feita pela ditadura, ao escolarizar a universidade, transformou-a em um curso secundário avançado, em um colegial avançado. Isso a Comissão da Verdade tem que mostrar, mostrar as datas em que os decretos vieram, as datas de implantação, quem implantou tudo isso, não pode passar em branco também.
Uma outra coisa que é muito importante é o fato de que as contratações dos jovens professores naquele período não eram feitas nem pelos departamentos, nem pelos institutos, mas diretamente pela reitoria. Estou dizendo isso porque quero fazer um complemento depois a respeito da reitoria atual. Como é que a reitoria procedia? Ela recebia o processo de contratação e mandava para o Dops, para a policia enviar a ficha policial do professor e saber se ele tinha participado de algum movimento. A reitoria queria a ficha policial, que era a ficha política do jovem professor. Em função disso, a reitoria dizia se contratava ou não contratava.

Eu posso fazer um depoimento junto à Comissão da Verdade, se ela quiser, da experiência direta que tive sobre isso. Eu era chefe do Departamento de Filosofia, havia o processo de contratação de um jovem professor e a contratação não saía, os papeis estavam na reitoria e pedi para ser informada do porquê de a contratação não acontecer. Fui empurrada de uma sala para outra sala, para outra sala, e ninguém respondia. Finalmente, fui levada a uma sala ao lado da sala do reitor. Esta sala não tinha janelas, tinha uma porta e duas cadeiras com uma mesinha. Ali, um senhor, um civil, grisalho, muito bem afeiçoado, me mandou sentar e disse para mim: “Vou explicar para a senhora que esta sala não existe, eu não existo e a conversa que nós vamos ter nunca aconteceu. O professor não pode ser contratado porque ele esteve em um encontro estudantil terrorista, então ele não vai ser contratado, aqui está o processo.” E foi quando eu vi, estava tudo anotado a lápis, com as informações sobre ele vindas do Dops. Ainda me disse: “Eu sei que ele era um lambari, sei que não é um perigo para a segurança nacional, mas ele tem essa ficha e não vai ser contratado.” E ele foi contratado, evidentemente vocês podem imaginar o barulho que nós fizemos, todo o escândalo que fizemos e o risco que se corria se ele não fosse contratado. Mas, era uma intimidação direta, não tinha algum esconderijo, era direto, na cara. Eu posso, eu tenho o poder, eu faço e você engole.

A manutenção da estrutura da Universidade de São Paulo tal como ela foi feita a partir do Ato Institucional número 5 pela ditadura é algo que tem que ser devassado se nós quisermos democratizar a universidade. Para democratizar nossa universidade, temos que desmontar aquilo que foi feito no final dos anos sessenta e no decorrer dos anos setenta, é uma tarefa imensa que tem que ser feita. E por que ela tem que ser feita? Porque, no momento que há uma hegemonia no estado de São Paulo de um pensamento privatista e de um pensamento neoliberal, a Universidade de São Paulo está sendo regida por estes princípios, por este reitor. Não é só isso, esse reitor foi formado, teve o aprendizado dele, como dirigente, nesse caldo de cultura da ditadura. Portanto, é essa forma de gestão que explica essa coisa inacreditável, e isso nem a ditadura fez, de por a polícia dentro do campus para espancar os alunos.

E, para encerrar, me disponho a dar meus depoimentos para a Comissão da Verdade. Penso, como os que me precederam, que tem que ser apanhado um período longo, e penso que, como se trata da Comissão da Verdade da Universidade, no caso da Universidade de São Paulo, é preciso contar não só as histórias ligadas à violência de Estado, ao terrorismo de Estado sobre os professores e os alunos, mas a maneira pela qual a universidade foi estruturada para ser um órgão da violência, um órgão do autoritarismo. Ela foi estruturada com a cabeça da ditadura e é por isso que ela é autoritária. E é isso que a Comissão da Verdade pode mostrar ao desvendar a maneira pela qual essa estrutura foi montada. E Salinas presente, Heleny presente.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Novas formas de velhas lutas

Tuitaço pelos 10% do PIB para a educação pública


11/06/201
Fonte: ARede

Nesta terça-feira, dia 12 de junho, está previsto o início da votação do novo PNE (Plano Nacional de Educação). Tramitando na Câmara dos Deputados como Projeto de Lei 8025/2010 (PL 8035/2010), será este plano que determinará as diretrizes, metas e estratégias educacionais para os próximos dez anos.

No momento, é o patamar de investimentos a serem feitos pelos governos federal, estaduais, distrital e municipais o principal ponto de divergência entre os atores envolvidos, isto é, governo e sociedade civil. O governo pretende disponibilizar recursos equivalentes a 7,5% do PIB (Produto Interno Bruto) para a educação pública. Em contrapartida, a sociedade civil exige, pelo menos, 10% do PIB para a área, procurando conciliar expansão do acesso à educação com melhoria do padrão de qualidade.

Para pressionar os parlamentares a aprovarem um PNE adequado, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação realiza, a partir de amanhã, nova mobilização virtual pelo Twitter. A ação acontecerá na terça e quarta-feira, respectivamente, dias 12 e 13 de junho, a partir das 10 horas da manhã até às 20 horas de cada data.

Nas últimas semanas, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação tem realizado tuitaços com o objetivo de pressionar deputados e deputadas da Comissão Especial que analisa o PNE a votarem pelos 10% do PIB.  Nos dias 29 e 30 do mês passado, as hashtags #VOTA10 e #PNEpraVALER foram tuitadas por milhares de estudantes, professores, ONGs, jornalistas, parlamentares e artistas. Isso possibilitou que o governo notasse o quanto a sociedade civil está atenta e preocupada com o andamento do PNE no Congresso. E fez com que diversos parlamentares se posicionassem positivamente aos 10% do PIB.

Segundo Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a adesão da sociedade civil em conjunto com a manifestação de parlamentares de diversos partidos tem conquistado a opinião pública. “O governo percebeu que há chance de ser aprovado o patamar de 10% do PIB para a educação. O próprio governo tem conhecimento de que se o índice não for aprovado pela Comissão Especial, os parlamentares levarão o tema a Plenário”, justifica o coordenador.

Vale lembrar que a  Campanha Nacional pelo Direito à Educação e a Fineduca (Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação) desenvolveram estudos que comprovam que os 7,5% do PIB são insuficientes e incapazes de aliar expansão de matrículas com padrão de qualidade. Além disso, o Comunicado 124 do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada do Governo Federal) apresenta diversas alternativas de fontes de financiamento capazes de viabilizar os 10% do PIB para a educação pública.  (Assessoria de imprensa)

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Urbanidade: uma questão de fundo para quem estuda a comunicação na contemporaneidade



Cidades-Urgente: colocar a questão urbana na agenda nacional

A Carta Maior está abrindo um espaço semanal, que será coordenado pela professora Ermínia Maricato para dar à questão urbana o lugar que lhe deveria caber no debate público. "As cidades fornecem destaques diários para a mídia escrita, falada e televisionada. A questão urbana, então, ocupa um espaço prioritário na agenda política nacional. Certo? Muito longe disso, a questão urbana está fora da agenda política nacional. Na próxima semana leremos alguns dos mais informados e experientes profissionais e estudiosos de políticas urbanas no Brasil, que, além dessas virtudes, se classificam como ativistas de direitos sociais e justiça urbana", explica a arquiteta e urbanista no artigo que abre esta seção.


Enchentes, desmoronamentos com mortes, congestionamentos, crescimento exponencial da população moradora de favelas (ininterruptamente nos últimos 30 anos), aumento da segregação e da dispersão urbana, desmatamentos, ocupação de dunas, mangues, APPs (Áreas de Proteção Permanente) APMs (Áreas de Proteção dos Mananciais), poluição do ar, das praias, córregos, rios, lagos e mananciais de água, impermeabilização do solo (tamponamento de córregos e abertura de avenidas em fundo de vales), ilhas de calor... e mais ainda: aumento da violência, do crime organizado em torno do consumo de drogas, do stress, da depressão, do individualismo, da competição. As cidades fornecem destaques diários para a mídia escrita, falada e televisionada. A questão urbana ocupa espaço prioritário na agenda política nacional. Certo?

Muito longe disso, a questão urbana está fora da agenda política nacional.

As conquistas institucionais nos anos recentes não foram poucas: promulgação do Estatuto das Cidades, aprovação dos marcos regulatórios do saneamento, dos resíduos sólidos, da mobilidade urbana, aprovação de uma enxurrada de Planos Diretores, criação do Ministério das Cidades, retomada das políticas de habitação e saneamento após décadas de ausência do Estado. No entanto, a crise urbana está mais aguda do nunca. Por que?

Numa sociedade persistentemente desigual as cidades não poderiam expressar o contrário. Mas há algo nas cidades que é central e ignorado. Trata-se do poder sobre o “chão”, ou seja, o poder sobre como se dá a produção e a apropriação do espaço físico. De todas as mazelas relacionadas acima, a primeira parte tem a ver com o “espaço urbano” ou com as formas de uso e ocupação do solo, essa evidência que nos cerca no cotidiano das cidades, mas que está oculta para Estado e sociedade. Assim como no campo, a terra urbana (pedaço de cidade) é o nó na sociedade patrimonialista.

A importância do espaço urbano como ativo econômico e financeiro escapa à percepção da maior parte dos urbanistas, engenheiros e economistas no Brasil (exceto dos que trabalham para o capital imobiliário). O valor da terra e dos imóveis varia de acordo com as leis ou investimentos realizados nas proximidades. Poderosos lobbies atuam sobre os orçamentos públicos dirigindo os investimentos e os destinos das cidades. Trata-se do que os americanos, Logan e Molotch, chamaram de “máquina do crescimento”: a reunião de interessados na obtenção de rendas, lucros, juros e... recursos para o financiamento de campanhas, acrescentamos nós. O planejamento urbano é o fetiche que encobre o verdadeiro negócio. É comum que um conjunto de obras contrarie o Plano Diretor. O mais frequente é vermos obras sem planos e planos sem obras.

O governo federal retomou as políticas de habitação e saneamento e se propõe a retomar a política de mobilidade urbana após décadas de ausência promovida pelo ideário neoliberal. Mas a retomada desses investimentos sem a reforma fundiária e imobiliária urbana (de competência municipal) traz consequências cruéis como a explosão dos preços dos imóveis. Durante os 50 anos em que urbanistas e movimentos sociais defenderam a Reforma Urbana, a exclusão territorial foi foi reinventada pelos que lucram com a cidade como ocorreu durante o período do BNH.

Ao contrário de um desenvolvimento socialmente justo e ambientalmente equilibrado, um dinâmico crescimento imobiliário reproduz características históricas de desigualdade e predação ambiental que, somadas ao grande número de carros que entopem a cada dia os sistemas viários, apontam para um rumo de consequências trágicas. Este tema deveria ocupar um lugar central na Rio +20.

Pesquisas recentes da USP ampliaram o conhecimento sobre o número de patologias causadas, na RM de São Paulo, pela poluição do ar, do som, ou pelos congestionamentos de tráfego: doenças cardíacas, transtornos mentais, ansiedade, depressão, estresse. O tempo médio das viagens diárias está próximo das 3 horas, sendo que para um terço da população passa disso. 30% das famílias são chefiadas por mulheres que após a jornada de trabalho chegam em casa e têm que dar conta dos filhos e do serviço doméstico. Tanto sofrimento exigiria repensar a prioridade dada ao automóvel em detrimento do transporte coletivo. Deve haver outras formas de criar empregos e aumentar o PIB sem gerar tal irracionalidade (do ponto de vista social e ambiental) urbana.

Os megaeventos (Copa, Olimpíadas) acrescentam alguns graus nessa febre. Por isso, os despejos de comunidades pobres que estão (e sempre estão) no caminho das grandes obras está ganhando dimensões não conhecidas até agora.

Embora a agenda social tenha mudado nos últimos 9 anos favorecendo ex-indigentes e miseráveis (bolsa família, pró-uni, crédito consignado, aumento do s.m.), embora as obras urbanas se multipliquem a partir do PAC e do MCMV, ambos por iniciativa do governo federal, as cidades pioram a cada dia.. Distribuição de renda não basta para termos cidades mais justas, menos ainda a ampliação do consumo pelo aumento do acesso ao crédito. É preciso “distribuir cidade”, ou seja, distribuir terra urbanizada, melhores localizações urbanas que implicam melhores oportunidades. Enfim, é preciso entender a especificidade das cidades onde moram mais de 80% da população do país e representam algumas das maiores metrópoles do mundo.

A Carta Maior ofereceu um espaço semanal para dar à questão urbana o lugar que lhe deveria caber na agenda política nacional. Na próxima semana leremos alguns dos mais informados e experientes profissionais e estudiosos de políticas urbanas no Brasil, que, além dessas virtudes, se classificam como ativistas de direitos sociais e justiça urbana.

Para seguir a trilha do desenvolvimento urbano, e não apenas crescimento urbano, revertendo o rumo atual, há conhecimento técnico, há propostas, há planos, há leis e até mesmo experiência profissional acumulada no Brasil. Ainda que no espaço de uma sociedade do capitalismo periférico ou “emergente”, como quer o main stream, é possível diminuir um pouco as selvagens relações sociais, econômicas e ambientais que vivemos nas cidades. Antes de apresentar propostas, que são rapidamente repetidas para serem também rapidamente esquecidas, é preciso mostrar porque a formulação de propostas, planos e leis não bastam. A questão é essencialmente política. É preciso mostrar a lógica do caos aparente, ou seja, a lógica dos que ganham com tanto sofrimento e suposta irracionalidade. As próximas eleições se referem ao poder local, ao qual cabe a competência sobre o desenvolvimento urbano de acordo com a Constituição Federal. Esperamos colaborar para diminuir o analfabetismo urbanístico e cobrar dos candidatos a prefeitos e vereadores maior conhecimento e compromisso com a justiça urbana.

(*) Erminia Maricato, arquiteta-urbanista, professora titular aposentada da FAU USP e professora da UNICAMP, é responsável por esta seção.