Nos EUA, a confirmação da mão de Roberto Marinho nos bastidores da ditadura
Em telegrama ao Departamento de
Estado norte-americano, embaixador Lincoln Gordon relata interlocução do
dono da Globo com cérebros do golpe em decisões sobre sucessão e
endurecimento do regime
Embaixador Gordon descreve em detalhes ao Departamento de Estado dos EUA a influência de Marinho
No dia 14 de agosto do 1965, ano seguinte
ao golpe, o então embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Lincoln
Gordon, enviou a seus superiores um telegrama então classificado como
altamente confidencial – agora já aberto a consulta pública. A
correspondência narra encontro mantido na embaixada entre Gordon e
Roberto Marinho, o então dono das Organizações Globo. A conversa era
sobre a sucessão golpista.
Segundo relato do embaixador, Marinho
estava “trabalhando silenciosamente” junto a um grupo composto, entre
outras lideranças, pelo general Ernesto Geisel, chefe da Casa Militar; o
general Golbery do Couto e Silva, chefe do Serviço Nacional de
Informação (SNI); Luis Vianna, chefe da Casa Civil, pela prorrogação ou
renovação do mandato do ditador Castelo Branco.
No início de julho de 1965, a pedido do
grupo, Roberto Marinho teve um encontro com Castelo para persuadi-lo a
prorrogar ou renovar o mandato. O general mostrou-se resistente à ideia,
de acordo com Gordon.
No encontro, o dono da Globo também
sondou a disposição de trazer o então embaixador em Washington, Juracy
Magalhães, para ser ministro da Justiça. Castelo, aceitou a indicação,
que acabou acontecendo depois das eleições para governador em outubro. O
objetivo era ter Magalhães por perto como alternativa a suceder o
ditador, e para endurecer o regime, já que o ministro Milton Campos era
considerado dócil demais para a pasta, como descreve o telegrama. De
fato, Magalhães foi para a Justiça, apertou a censura aos meios de
comunicação e pediu a cabeça de jornalistas de esquerda aos donos de
jornais.
No dia 31 de julho do mesmo ano houve um
novo encontro. Roberto Marinho explica que, se Castelo Branco
restaurasse eleições diretas para sua sucessão, os políticos com mais
chances seriam os da oposição. E novamente age para persuadir o
general-presidente a prorrogar seu mandato ou reeleger-se sem o risco do
voto direto. Marinho disse ter saído satisfeito do encontro, pois o
ditador foi mais receptivo. Na conversa, o dono da Globo também disse
que o grupo que frequentava defendia um emenda constitucional para
permitir a reeleição de Castelo com voto indireto, já que a composição
do Congresso não oferecia riscos. Debateu também as pretensões do
general Costa e Silva à sucessão.
Lincoln Gordon escreveu ainda ao
Departamento de Estado de seu país que o sigilo da fonte era essencial,
ou seja, era para manter segredo sobre o interlocutor tanto do
embaixador quanto do general: Roberto Marinho.
O histórico de apoio das Organizações Globo à ditadura não dá margens
para surpresas. A diferença, agora, é confirmação documental.
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